12.4.07

Do 'catolicismo progressista' à 'Acção Directa' - um texto de João P. Noronha

Publicado em
http://facaseluz.blogspot.com/ (6/3/2007)

A revista Actual do Expresso concede 3 páginas ao livro “Entre as Brumas da Memória – Os Católicos Portugueses e a Ditadura”, de Joana Lopes.

1 - De acordo com este artigo:
  • Os ‘cristãos progressistas’ sentiram-se interpelados pela Encíclica Pacem in Terris. Pretendiam “ajudar a Igreja a renovar-se e Portugal a sair do fascismo”.
  • Mas a visita de Paulo VI a Fátima e a publicação da “decepcionante encíclica «Humanae Vitae»” forçou estes ‘católicos progressistas’ a abandonarem a Igreja. A autora confessa que nesse momento: “a religião saiu da minha vida ou eu dela”.
  • Nalguns casos, na sequência da apostasia destes cristãos, muitos seguiram a via da violência revolucionária. O autor do artigo revela que:
    ”[a] deserção dos católicos progressistas, em muitos casos deu lugar a um intenso activismo político. Quase nunca no PCP, mas em organizações à sua esquerda, designadamente no futuro MES. A autora optou pela «acção directa» que caracterizou uma certa extrema-esquerda. Primeiro no LUAR, depois no PRP/BR, onde se encontrava no 25 de Abril. Nessa altura, porém, já «a laicidade tinha tomado definitivamente conta da minha existência»”

2 - Ou seja, a autora do livro viu as expectativas criadas pela Pacem in Terris goradas pela visita de Paulo VI a Fátima e pela publicação da Humanae Vitae. E, assim, viu-se forçada a abandonar a Igreja e a dedicar-se ao terrorismo. A culpa é da Igreja que não soube renovar-se. Tivesse a Igreja seguido a linha doutrinal proposta pelos progressistas, e a autora do livro não teria sido obrigada a dedicar-se à revolução.

3 - Mas este raciocínio é, no mínimo, estranho.

Eu estive a ler a Pacem in Terris, e nela só encontro apelos à paz, à concórdia e à participação construtiva dos católicos nas nossas sociedades modernas.

E o Papa João XXIII até adverte contra certos entusiasmos mais revolucionários e violentos:

”Não faltam almas dotadas de particular generosidade que, ao enfrentar situações pouco ou nada conformes com as exigências da justiça, se sentem arder no desejo de tudo renovar, deixando-se arrebatar por ímpeto tal, que até parecem propender para uma espécie de revolução.

Lembrem-se, porém, de que, por necessidade vital, tudo cresce gradualmente. Também nas instituições humanas nada se pode renovar, senão agindo de dentro, passo por passo. Já o nosso predecessor, de feliz memória, Pio XII o proclamava com estas palavras: "Não é na revolução que reside a salvação e a justiça, mas sim na evolução bem orientada. A violência só e sempre destrói, nada constrói; só excita paixões, nunca as aplaca; só acumula ódio e ruínas e não a fraternidade e a reconciliação. A revolução sempre precipitou homens e partidos na dura necessidade de terem que reconstruir lentamente, após dolorosos transes, por sobre os escombros da discórdia".”

As condições necessárias para garantir que a resistência armada à autoridade é moralmente legítima são de realização quase impossível (cf. n.º2243 do Catecismo). E o autor da Pacem in Terris parece concordar que os objectivos expressos na Encíclica não jusitificam a violência revolucionária.

Mais, a encíclica não menciona, nem nada promete em relação ao controlo dos nascimentos.

E muito menos a visita de Paulo VI terá contrariado a defesa da evolução gradual das sociedades defendida por João XXIII na Pacem in Terris.

As motivações destes ex-'católicos progressistas', revolucionários da extrema-esquerda não parecem ser aquelas que eles apresentam.

4 - Donde vem então este impulso destruidor e violento que pretende impor pela força determinados ideais, sacrificando a Fé e a pertença à Igreja a outros objectivos mais terrenos e moralmente ilegítimos?

Acima, fez-se referência ao facto dos 'católicos progressistas' pretenderem “ajudar a Igreja a renovar-se”. É no orgulho expresso nesta frase que está a chave para perceber o desastre que se seguiu. É o preconceito fatal de quem pensa saber melhor que a Igreja qual é a sua missão nesta terra.

Não somos nós que ajudamos a Igreja a renovar-se; é antes a Igreja que ajuda a nossa renovação à imagem de Cristo. É essa revolução que os progressistas deveriam ter procurado. Mudar o Mundo uma pessoa de cada vez, começando por nós próprios, e tendo Jesus por modelo e a Igreja por Mestra.

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