4.6.07

Ainda no rescaldo de Coimbra


No debate que decorreu durante a secção de lançamento do meu livro em Coimbra, a Manuela Cruzeiro fez-me uma pergunta relacionada com a evolução psicológica que levou tantos dos chamados «católicos progressistas» da década de 60 não só a abandonarem a prática religiosa como a optarem por formas de luta radicais.

Lembrei-me agora de que poderia ser interessante pôr aqui parte de um artigo que escrevi para o nº 3 dos Cadernos Socialistas, publicados no estrangeiro por exilados políticos portugueses. Não que acrescente algo de novo ao que foi dito em Coimbra, mas porque foi escrito no verão de 1968 (poucos dias antes de Salazar cair da cadeira) e mostra como me aparecia já como inevitável a debandada de católicos que veio a verificar-se pouco depois e a evolução para formas mais radicais de luta (explico este aspecto na última parte do artigo, em texto que constitui o Anexo 16 de Entre as Brumas..., pp. 237-239.)

N. B. – O artigo é longo e, por essa razão, inadequado para ser transcrito aqui na íntegra. Mas se alguém estiver interessado, terei o maior prazer em o enviar por mail.

Acção Eclesial e Acção Política
Por: Manuela Gomes (pseudónimo de Joana Lopes). Usei pseudónimo, porque, ao contrário dos outros colaboradores deste número dos Cadernos Socilaistas, eu vivia em Portugal...

«4. Foram-se fazendo diferentes tipos de evoluções pessoais que têm, pouco a pouco, dividido os “cristãos conciliares”. Essa divisão parece-nos não só inevitável mas salutar, mas ela é objecto de inúmeras discussões e é dificilmente aceite pelos que querem agarrar-se a uma unidade que já não existe.

Alguns (cada vez menos) continuam sinceramente a querer antes de mais “reformar” a Igreja, tendo dela uma visão renovada, a querer levar por diante, mesmo que muito dificilmente, a tarefa de “aggiornamento” que o Concílio prometeu e fez desejar, mantendo uma colaboração mais ou menos estreita com a hierarquia e o conjunto dos católicos. Crêem contribuir assim para a efectivação de uma sociedade portuguesa mais humana.

Mas sem dúvida alguma que a maior parte dos católicos de que temos vindo a falar, desde há um certo tempo que pretende simultaneamente, ou mesmo acima de tudo, o fim do salazarismo e subordina a esse objectivo o esforço principal da sua acção, mesmo quando tem consciência de que esta só pode corresponder longínqua e indirectamente a esse objectivo.

Uns deixaram já há um certo tempo de assinar cartas aos bispos e afirmam que deixaram de se considerar como fazendo parte da Igreja institucional.

Mas muitos mais são os que até agora mantêm ligações, mais ou menos estreitas segundo os casos, com as estruturas eclesiásticas, que assinam todas as cartas de protesto, que vibram intensamente com o caso do Pe.Felicidade, que ocupam longas horas em conversas e discussões mais ou menos religiosas sobre Deus, moral, violência ou não violência, que organizam colóquios, que passam noites a policopiar papéis e dias a distribui-los. Tudo isto pode parecer pouco, mas ocupa muito tempo de muitas vidas.

E, no entanto, para alguns a realidade começa a mudar:

• Eles sentem que o reformismo da Igreja, por que têm vindo a lutar, esbarra sistematicamente com inércia e conservantismo acompanhados de um exercício abusivo de poder – e se revela portanto globalmente ineficaz.

• Fizeram uma evolução interior do ponto de vista religioso que os vai desinteressando de um certo número de querelas e para a qual o Concílio pertence já a um passado que se encerra.

• Começam a ver que o papel policopiado (cartas, manifestos, “Direito à Informação”) têm a sua função, mas é por si só incapaz de abalar as forças opressoras ou mesmo de modificar em profundidade a opinião pública.

• Os padres que compartilham este estado de espírito interrogam-se cada vez mais sobre o mal-entendido em que se sentem envolvidos vitalmente e sobre os resultados destes anos de esforço e de incompreensão. Como em todos os países, alguns dos mais válidos pediram a redução ao estado de leigo, outros estudam no estrangeiro.

• Alguns leigos, que no período pós-conciliar tinham começado ou recomeçado a trabalhar em instituições eclesiais, estão a deixá-las, cansados e desiludidos, ou considerando, simplesmente, que elas correspondem a interesses de outros, mas não aos seus.»

4 comments:

Rui P. Bebiano disse...

Cara Joana

Este pequeno texto é sem dúvida um aperitivo daqueles que de facto o são e que abre o apetite para mais.

Fiquei de facto curioso, por isso me atrevia a pedir-lhe então o envio por mail ( para rpbebiano@gmail.com ) do texto completo.

E ainda vou arranjar um tempinho para mais uma volta á Feira do Livro e comprar o seu.

(o outro) Rui Bebiano

Joana Lopes disse...

Rui,
Já seguiu por mail. Volte sempre.
Parece que ainda há um 3º Rui Bebiano!!

Anónimo disse...

Boa noite, Joana!
Também não conheço o artigo integralmente. Queres mandar-me também por e-mail?

sem-se-ver disse...

sem-se-ver@sapo.pt

pode ser?...

obg :-)