8.12.07

Se o ridículo matasse

... já não estaríamos a falar de Mugabe. Dele que já tem 83 anos, num país em que a esperança de vida não chega aos quarenta.

Vive num palácio grotesco que incarna o pior que os colonizadores deixaram no imaginário dos colonizados. Salões, veludos, mármores e rendilhados, em plena África, numa terra que já viu partir seis milhões dos seus.

Desvario em que a realidade ultrapassa a ficção e o decoro – vá lá saber-se até quando.

Claro que Mugabe não é, infelizmente, um caso isolado. Mas serve como símbolo.













Welcome to Zimbabwe

Estive aqui em Junho. Tirei a fotografia, mas não entrei.


Durante todo o dia, filas intermináveis de pessoas esperavam por um carimbo que as deixasse entrar na Zâmbia.

6.12.07

Ser amigos, estar protegidos, ser católicos

... é o título do livro infantil para colorir, editado pela arquidiocese de Nova Iorque e a que já me referi aqui. Deixo hoje mais uma página.

A «anja-da-guarda» (um tanto Lolita, by the way) dá conselhos quanto a partes do corpo. Cliquem na imagem para a aumentar e leiam o texto porque vale a pena (*).



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(*) Na versão espanhola, já que hoje foi impossível aceder à inglesa, por excesso de pesquisas. (Ambas alojadas aqui.)

Colóquio «Dever da Memória»


O movimento NÃO APAGUEM A MEMÓRIA! realizou ontem, 5 de Dezembro, um Colóquio cujo resumo pode ser lido aqui.

5.12.07

A pedofilia explicada às criancinhas

... num livro para colorir publicado pela diocese de Nova Iorque (*).

Um adulto e uma criança sozinhos (mesmo numa igreja ou sacristia)? Só de porta aberta ou se houver uma grande janela – explica o anjo-da-guarda.



(*) Descoberto aqui.

???

Quando eu for grande, hei-de tentar perceber quem é o Tiago Mendes e o que é que lhe aconteceu.

Parece que houve uns problemas lá pela Atlântico. Devem ter sido grandes, porque anda meia blogosfera a falar deles.

Ainda bem - porque o Chávez já deu o que tinha a dar e o Mugabe ainda não chegou.

4.12.07

Lugares da História - Convento do Carmo

Foto: Centro de Documentação 25 de Abril


5 de Outubro de 1910 – Machado dos Santos aceita a rendição do Estado-Maior das forças fiéis à Monarquia.

14 de Maio de 1915 – Refúgio e demissão do general Pimenta de Castro.

18 de Abril de 1925 – Teixeira Gomes e o seu ministério dialogam com o general Sinel de Cordes, delegado dos revoltosos.

19 d Julho de 1925 – Refúgio de Teixeira Gomes e de António Maria da Silva durante a intentona de Mendes Cabeçadas.

25 de Abril de 1974 – Refúgio e rendição de Marcelo Caetano.

11 de Março de 1975 – Rendição da GNR que apoiara a tentativa de golpe do general Spínola.

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Fonte:
Fernando Rosas, Lisboa Revolucionária. Roteiro dos Confrontos Armados no Século XX, Tinta-da-China, Lisboa, 2007, 322 p. (pp. 134-136)

Darfur? Zimbabwe? Não conhecemos

Depois da cimeira UE/China sem direitos humanos, UE/África sem Darfur nem Zimbabwe.

«Dois dos dossiers mais quentes em África - o drama humanitário do Darfur e a questão do Zimbabwe - serão mantidos à margem da agenda oficial da cimeira UE-África. (...)

Escritores europeus e africanos, incluindo cinco prémios Nobel, acusam os líderes dos dois continentes de "cobardia" por evitarem abordar na cimeira as crises no Zimbabwe e no Darfur.
"Porque devemos ouvir os poderosos quando estes não ouvem os gritos dos que sofrem? Milhões de africanos e europeus esperariam que o Zimbabwe e o Darfur estivessem no topo da agenda", afirmam os 17 subscritores da carta, enviada a todos os chefes de Estado e de Governo que irão estar presentes na cimeira. "Ainda não é demasiado tarde" para incluir as duas crises na agenda.
Entre os subscritores constam cinco prémios Nobel da Literatura: os europeus Günter Grass e Dario Fo, e, do lado africano, Nadine Gordimer, John Coetzee e Wole Soyinka. José Gil é o único português signatário, num rol em que aparece também o moçambicano Mia Couto. "Que podemos dizer desta cobardia política?", interrogam».

3.12.07

Vitórias e derrotas

Actualizado (*):



A preocupação com a sólida vitória de Putin não deve ser maior do que o regozijo pela derrota tangencial de Chávez?


(*) Citando (e «linkando») o Abrupto:
«Putin é muito mais perigoso do que Chávez, mas Chávez é muito mais folclórico e engraçado, Putin é sinistro e não tem humor. Chávez dá para se "ser" da "esquerda" e da "direita", Putin não. Chávez é muito da cultura blogue, Putin não.»

2.12.07

A Esperança de Bento XVI


Os dois textos mais rebarbativos com que deparei nos últimos tempos foram o chamado Tratado Reformador da União Europeia e a recentíssima encíclica de Bento XVI Spe Salvis. Nada têm em comum a não ser o facto de serem produtos tipicamente europeus, no mau sentido, pela sua inútil dimensão e complexidade (*).

Este texto do papa sobre a virtude da Esperança dirige-se a todos os católicos, mas permito-me duvidar que tenha muitos leitores entre o comum dos mortais. Primeiro porque é muito longo – tem 77 páginas. Segundo porque não creio que os jovens do século XXI, os chineses, os africanos e muitos outros, mesmo que entusiasticamente crentes e seguidores da Igreja católica, parem muito tempo para penetrar em parágrafos como este:

«Para compreender mais profundamente esta reflexão sobre as duas espécies de substâncias – hypostasis e hyparchonta – e sobre as duas maneiras de viver que com elas se exprimem, devemos reflectir ainda brevemente sobre duas palavras referentes ao assunto, que se encontram no décimo capítulo da Carta aos Hebreus. Trata-se das palavras hypomone (10,36) e hypostole.»(10,39).»

Deixando de lado todo o conteúdo propriamente religioso, limito-me a chamar a atenção para as reflexões que Ratzinger faz sobre o marxismo e os seus erros (que já foram ironicamente consideradas por alguns como um elogio) – estas sim numa linguagem simples, talvez mesmo simplista, demasiado Readers Digest.

Prefiro citá-lo (poupando aos leitores o trabalho de localizarem esta passagem no emaranhado das setenta e sete páginas):

«Depois da revolução burguesa de 1789, tinha chegado a hora para uma nova revolução: a proletária. O progresso não podia limitar-se a avançar de forma linear e com pequenos passos. Urgia o salto revolucionário. Karl Marx recolheu este apelo do momento e, com vigor de linguagem e de pensamento, procurou iniciar este novo passo grande e, como supunha, definitivo da história rumo à salvação, rumo àquilo que Kant tinha qualificado como o «reino de Deus». Tendo-se diluída a verdade do além, tratar-se-ia agora de estabelecer a verdade de aquém. A crítica do céu transforma-se na crítica da terra, a crítica da teologia na crítica da política. O progresso rumo ao melhor, rumo ao mundo definitivamente bom, já não vem simplesmente da ciência, mas da política – de uma política pensada cientificamente, que sabe reconhecer a estrutura da história e da sociedade, indicando assim a estrada da revolução, da mudança de todas as coisas. Com pontual precisão, embora de forma unilateralmente parcial, Marx descreveu a situação do seu tempo e ilustrou, com grande capacidade analítica, as vias para a revolução. E não só teoricamente, pois com o partido comunista, nascido do manifesto comunista de 1848, também a iniciou concretamente. A sua promessa, graças à agudeza das análises e à clara indicação dos instrumentos para a mudança radical, fascinou e não cessa de fascinar ainda hoje. E a revolução deu-se, depois, na forma mais radical na Rússia.

Com a sua vitória, porém, tornou-se evidente também o erro fundamental de Marx. Ele indicou com exactidão o modo como realizar o derrubamento. Mas, não nos disse, como as coisas deveriam proceder depois. Ele supunha simplesmente que, com a expropriação da classe dominante, a queda do poder político e a socialização dos meios de produção, ter-se-ia realizado a Nova Jerusalém. Com efeito, então ficariam anuladas todas as contradições; o homem e o mundo haveriam finalmente de ver claro em si próprios. Então tudo poderia proceder espontaneamente pelo recto caminho, porque tudo pertenceria a todos e todos haviam de querer o melhor um para o outro. Assim, depois de cumprida a revolução, Lenin deu-se conta de que, nos escritos do mestre, não se achava qualquer indicação sobre o modo como proceder. É verdade que ele tinha falado da fase intermédia da ditadura do proletariado como de uma necessidade que, porém, num segundo momento ela mesma se demonstraria caduca. Esta «fase intermédia» conhecemo-la muito bem e sabemos também como depois evoluiu, não dando à luz o mundo sadio, mas deixando atrás de si uma destruição desoladora. Marx não falhou só ao deixar de idealizar os ordenamentos necessários para o mundo novo; com efeito, já não deveria haver mais necessidade deles. O facto de não dizer nada sobre isso é lógica consequência da sua perspectiva. O seu erro situa-se numa profundidade maior. Ele esqueceu que o homem permanece sempre homem. Esqueceu o homem e a sua liberdade. Esqueceu que a liberdade permanece sempre liberdade, inclusive para o mal. Pensava que, uma vez colocada em ordem a economia, tudo se arranjaria. O seu verdadeiro erro é o materialismo: de facto, o homem não é só o produto de condições económicas nem se pode curá-lo apenas do exterior criando condições económicas favoráveis.
(...)

Torna-se evidente que o homem necessita de uma esperança que vá mais além. Vê-se que só algo de infinito lhe pode bastar, algo que será sempre mais do que aquilo que ele alguma vez possa alcançar. Neste sentido, a época moderna desenvolveu a esperança da instauração de um mundo perfeito que, graças aos conhecimentos da ciência e a uma política cientificamente fundada, parecia tornar-se realizável. Assim, a esperança bíblica do reino de Deus foi substituída pela esperança do reino do homem, pela esperança de um mundo melhor que seria o verdadeiro «reino de Deus».

Estilo diferente de um papa diferente – sem dúvida.
Sinceramente, nem estou muito interessada em saber se mudará ou não qualquer coisa no interior da Igreja. Mas continuo a não acreditar que esteja a ser um agente mobilizador para que os povos vivam melhor e avancem com esperança. Antes estivesse.

(*) Texto integral aqui.