16.6.09

A outra esquerda














Os resultados das recentes eleições europeias trouxeram uma evidente dor de cabeça ao PS de Sócrates: a derrota foi mais expressiva do que se pensava, atingindo mínimos históricos; a direita ficou-se pelos 40%, o que torna pouco atraente o discurso choroso do "voto útil"; e a esquerda à esquerda do PS cresceu significativamente, com particular destaque para o Bloco, que ascendeu a terceira força política e triplicou o número de eleitos.

Curioso tem sido o modo como as hostes do partido do governo têm interpretado o desaire eleitoral. Algumas almas incomodadas chegaram mesmo a comparar o resultado do Bloco de Esquerda à ascensão da extrema-direita em alguns países da Europa, englobando ambos na categoria difusa dos "votos de protesto". Deixando de lado a comparação provocadora e a incapacidade de perceber a sólida dinâmica de crescimento do Bloco, a verdade é que o raciocínio é ilustrativo do modo como alguma elite política gosta de se ver a si própria: ou nós ou o caos.

Pela enésima vez, Augusto Santos Silva, o arauto do Reino, agita o fantasma da esquerda totalitária, amante dos gulags e desrespeitadora da democracia. Para além da "esquerda democrática" - obediente à NATO, incapaz de repensar o país, a Europa e o mundo num contexto de "crise" e esquecida da sua raison d'être - situar-se-ia esta "outra esquerda", espécie de lobo mascarado de cordeiro no âmago das "instituições".

Alguma razão terá Santos Silva: esta é mesmo "outra" esquerda. Uma esquerda que se sabe herdeira da história do socialismo mas que olha para o passado sem preconceitos nem medo de se transformar numa estátua de sal; uma esquerda que prefere debater ideias e apresentar propostas alternativas ao invés de responder ao chavão da "governabilidade"; uma esquerda que no dia seguinte às eleições resolveu colocar um cartaz a lembrar o flagelo do desemprego e os 200.000 homens e mulheres que, nesta situação, permanecem sem qualquer subsídio. Pensando bem, talvez seja mesmo isso que os assuste.

Um texto de Miguel Cardina

2 comments:

F. Penim Redondo disse...

Miguel Cardina está muito enganado se pensa que é só o PS que está em maus lençóis.
Para não me alongar remeto para http://dotecome.blogspot.com/2009/06/o-ps-em-maus-lencois.html

Ana Cristina Leonardo disse...

a mim o que me parece é que ser contra a tal esquerda totalitária no século XXI é demasiado fácil. Cheira a mofo quase 70 anos depois de O Zero e o Infinito!!