12.7.11

Mais complexo que ratings e deficits


E, de repente, foi como se a Moody’s e suas congéneres tivessem passado a ser culpadas de quase tudo (sem que ponhamos em causa a sua própria existência, mesmo que nos tivessem classificado com um belíssimo AAA…), num clamor patriótico que, como alguém lembrou, só parece ter tido equivalente recente em torno da questão de Timor (por onde andas, Luís Represas?...).

Passa-se para segundo ou para terceiro plano a nossa má integração na União Europeia e no euro, por culpa própria e não só, omite-se que vivemos numa democracia sequestrada pelo poder financeiro e que a batalha a travar é bem mais difícil e mais complexa do que reduzir o deficit aos valores desejados pela senhora Merkel e por Durão Barroso (se é que este deseja mais do que salvar a própria pele…).

Regresso ao livro de Boaventura Sousa Santos, que tenho vindo a citar (*).

«Os fundos estruturais e de coesão foram desbaratados no que constitui a história mais secreta da corrupção em Portugal. O euro, combinado com a abertura da economia europeia ao mercado mundial foi a última machadada nas aspirações portuguesas, pois tínhamos têxteis e sapatos para vender, mas não aviões nem comboios de alta velocidade.

Os termos da integração foram-nos sendo progressivamente mais desfavoráveis, o projecto europeu foi-se desviando das vontades originais e os mercados financeiros aproveitaram-se das brechas criadas na defesa da zona euro para se lançarem na pilhagem em que são peritos, agravando as condições do país muito para além do que pode ser legitimamente atribuído à nossa incúria ou incompetência. A verdade é que vivemos a hora dos grupos e classes dominantes, cujo poder parece demasiado forte para poder ser desafiado, e nunca tanta força esteve ligada a tanta ausência de projecto. A democracia, que aparentemente controla o seu poder, parece sequestrada por ele. Vivemos um tempo de explosão da precaridade, obscena concentração da riqueza, empobrecimento das maiorias e incontrolável perda do valor da força do trabalho.» (p.152)
(O realce é meu.)

(*) Portugal. Ensaio contra a autoflagelação, Almedina.
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