5.3.11

E o vencedor será…

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Só há pouco soube que é este mês, esta semana, esta noite, que a RTP1 transmite o Festival da Canção 2011… Longe vão as décadas em que os amigos se reuniam em casa uns dos outros para acompanharem um dos acontecimentos televisivos do ano (que não eram muitos, diga-se de passagem)!

Percebi também que uma das canções apuradas é dos «Homens da Luta» e que vai por aí alguma mobilização para tentar que ganhe, já que , ao que parece, a votação do público, por telefone, vale 50%.

Pelas características do grupo, pela letra e pelo momento em que aparece, é impossível não pensar que, caso vencesse (o que é evidentemente muito pouco provável), estaríamos em presença de um remake quase perfeito do que aconteceu em 1973, com a vitória da «Tourada». Quem já era então crescido, dar-me-á razão.



P.S. - E não é que ganharam mesmo?
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Março

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Imagens que valem 1.000 comunicados



O Facebook está inundado de cartazes, desenhos e slogans relacionados com a manifestação da «Geração à Rasca».

Ontem, o Filipe Homem Fonseca fez uma fotomontagem, mais tarde a Gui Castro Felga transformou em «boneco».

Cruel? Sem dúvida. É também a função das imagens e estas vieram para ficar.
...ieram para ficar

4.3.11

«Dançaremos “Zenga Zenga” quando Kadafi cair!»


Noy Alooshe, jornalista israelita, viu o discurso se Kadafi do dia 22 de Fevereiro – «estranhamente vestido e levantando os braços, como num trance party» - e imaginou este clipe que joga com a palavra zanqa (beco), repetidamente ultilizada pelo líder líbio nas ameaças de perseguições, «centímetro por centímetro, casa por casa, lar por lar, beco por beco».

Trata-se de uma versão de «Hey Baby» by Pitbull & T Pain, funciona como uma espécie de hino para os revoltosos líbios e já se espalhou pelos restantes países do mundo árabe.

Nos primeiros quatro dias, foi visto por 500.000 pessoas no Youtube.



uma outra versão «censurada» pelo próprio, a pedido (sem a bailarina).

(A partir daqui)
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Que fique bem claro

(desenho da Gui Felga)

… uma vez mais, que o Protesto da Geração à Rasca NADA TEM A VER com uma outra manifestação, também nascida no Facebook e que se auto-denomina «1 milhão na Avenida da Liberdade pela demissão de toda a classe política».


A primeira publicou hoje mais um Esclarecimento:

Reafirmamos a total independência do protesto face a qualquer estrutura ou movimento de cariz partidário, político ou ideológico.

Este é um protesto: Apartidário, aberto a todos os partidos e a quem não tem preferência partidária; Laico, aberto a todas as religiões e a quem não tem religião; e Pacífico!

Nunca foi enviada qualquer lista de reivindicações. O manifesto é o único documento associado ao protesto.

Não protestamos pela demissão de nenhum político ou governo.

Queremos reforçar a democracia participativa e nunca o seu contrário!


Foi também divulgada uma Carta aberta à Sociedade Civil

Carta aberta a todos os Cidadãos, Associações, Movimentos Cívicos, Partidos, Organizações Não-Governamentais, Sindicatos, Grupos Artísticos, Recreativos e outras Colectividades:

Protesto da Geração À Rasca
12 de Março às 15 horas
Avenida da Liberdade – Lisboa e Praça da Batalha – Porto

Exmos. Srs.,

O «Protesto da Geração À Rasca» surgiu de forma espontânea, no Facebook, fruto da insatisfação de um grupo de jovens que sentiram ser preciso fazer algo de modo a alertar para a deterioração das condições de trabalho e da educação em Portugal.
Este é um protesto apartidário, laico e pacífico, que pretende reforçar a democracia participativa no país, e em consonância com o espírito do Artigo 23º da Carta Universal dos Direitos Humanos:

1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego.
2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.
3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de protecção social.
(…)

Por isso, protestamos:
-Pelo direito ao emprego.
-Pelo direito à educação.
-Pela melhoria das condições de trabalho e o fim da precariedade.
-Pelo reconhecimento das qualificações, competências e experiência, espelhado em salários e contratos dignos.

Porque não queremos ser todos obrigados a emigrar, arrastando o país para uma maior crise económica e social.

Segundo o INE, o desemprego na faixa etária abaixo dos 35 anos corresponde hoje à metade dos 619 mil desempregados em Portugal. A este número podemos juntar os milhares em situação de precariedade: “quinhentoseuristas” e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, estagiários, bolseiros e trabalhadores-estudantes.
No que concerne à educação, o acentuar das desigualdades no acesso ao ensino limita as oportunidades individuais. Milhares de pessoas são impedidas de ingressar ou obrigadas a abandonar os seus estudos. Outras ainda vivem situações de indignidade humana para conseguirem prosseguir os seus percursos académicos.

Não negligenciamos os problemas estruturais, domésticos e internacionais, que afectam a vida de muita gente na procura e obtenção de emprego. Queremos alertar para a urgência de repensar estratégias nacionais e não nos resignamos com os argumentos de inevitabilidade desta situação. É com sentido de responsabilidade que afirmamos que, sendo nós a geração mais qualificada de sempre, queremos ser parte da solução.

No dia 12 de Março, pelas 15 horas, convidamo-lo a estar presente na Avenida da Liberdade em Lisboa ou na Praça da Batalha no Porto, no Protesto da Geração à Rasca cujo manifesto abaixo citamos.

João Labrincha
Paula Gil
Alexandre de Sousa Carvalho
António Frazão

Na cama com Kadafi

(Durão Barroso, Sarkozy, Obama, Cameron, Merkel e Berlusconi)

(Daqui)
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Ontem, hoje e amanhã?


A notícia é longa, foi publicada no Diário de Lisboa de 23 de Janeiro de 1965, pode ser lida no fim deste post e foi enviada pela Diana Andringa como contributo para este blogue.

Dois ministros, o chefe de gabinete e o secretário de um deles, e a «esposa» e um filho do segundo, foram de Lisboa ao Algarve, num avião da Força Aérea, para condecorarem a professora primária de ambos, «que, desde muito nova e em missão de sacerdócio (…), tem desempenhado, com especial carinho e singeleza, formando alunas cristãs e de boa moral, a sua profissão».

Algumas observações:
- O aeroporto de Faro só foi inaugurado oficialmente cerca de seis meses mais tarde, o que explica talvez o alvoroço que a notícia descreve, provocado pela chegada do avião.
- A utilização de meios públicos para fins privados vem de longe (fazia-se, sim, no tempo de Salazar…), mas tem hoje nuances diferentes.
- Tudo isto é provinciano e paroquial, reflecte o rosto público do que era o regime que parecia «ingénuo» mas não o era. Uma referência? Duas semanas mais tarde, Humberto Delgado foi assassinado em Espanha.

Ver a notícia completa:

3.3.11

Declaração



Je déclare l'état de bonheur permanent
Et le droit de chacun à tous les privilèges
Je dis que la souffrance est chose sacrilège
Quand il y a pour tous des roses et du pain blanc

Je conteste la légitimité des guerres
La justice qui tue et la mort qui punit
Les consciences qui dorment au fond de leur lit
La civilisation au bras des mercenaires

Je regarde mourir ce siècle vieillissant
Un monde différent renaîtra de ses cendres
Mais il ne suffit plus simplement de l'attendre
Je l'ai trop attendu je le veux à présent

Que ma femme soit belle à chaque heure du jour
Sans avoir à se dissimuler sous le fard
Et qu'il ne soit plus dit de remettre à plus tard
L'envie que j'ai d'elle et de lui faire l'amour

Que nos fils soient des hommes non pas des adultes
Et qu'ils soient ce que nous voulions être jadis
Que nous soyons frères camarades et complices
Au lieu d'être deux générations qui s'insultent

Que nos pères puissent enfin s'émanciper
Et qu'ils prennent le temps de caresser leur femme
Après toute une vie de sueur et de larmes
Et des entre-deux-guerres qui n'étaient pas la paix

Je déclare l'état de bonheur permanent
Sans que ce soit des mots avec de la musique
Sans attendre que viennent les temps messianiques
Sans que ce soit voté dans aucun parlement

Je dis que désormais nous serons responsables
Nous ne rendrons de compte à personne et à rien
Et nous transformerons le hasard en destin
Seuls à bord et sans maître et sans dieu et sans diable

Et si tu veux venir passe la passerelle
Il y a de la place pour tous et pour chacun
Mais il nous reste à faire encore du chemin
Pour aller voir briller une étoile nouvelle

Je déclare l'état de bonheur permanent
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De Castells à manifestação de 12 de Março


Vale a pena ler uma entrevista que Manuel Castells deu a Jordi Rovira sobre Internet e Rebelião (aqui, em português), a propósito dos recentes acontecimentos no mundo árabe.

É relativamente longa, são abordados vários temas importantes, mas destaco apenas este:

«O importante das “wikirrevoluções” (as que se auto-geram e se auto-organizam) é que as lideranças não contam, são puros símbolos.

Símbolos que não mandam nada, pois ninguém os obedeceria, eles tampouco tentariam impor-se. Pode ser que, uma vez institucionalizada, a revolução coopte algumas destas pessoas como símbolos de mudanças (…). Cohn Bendit era também um símbolo, não um líder (…). Walesa foi diferente, um vaticanista do aparato sindical. Por isso, tornou-se político rapidamente. Cohn Bendit tardou muito mais.»

O que é válido para a Praça Tahrir serve-nos também, com todas as devidas distâncias e proporções, como matéria para reflexão, a poucos dias da manifestação da «Geração à Rasca», que incomoda tanta gente precisamente porque os seus organizadores se recusam a ser líderes da iniciativa.

É ver todos os comentadores encartados bem estupefactos com esta presença propositada apenas nos bastidores, perdidos numa teia de teorias da conspiração que a expliquem, à procura de etiquetas, sem entenderem o que está realmente em questão.

Mas é caso para dizer que «se habituem» porque se trata de algo que veio para ficar. Ou, já que se citou Cohn-Bendit, que «ce n’est qu’un début!…»
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Se está no Youtube, deve ser verdadeiro...

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Explica isso e muitas coisas mais


Do telegrama do WikiLeaks, divulgado hoje pelo Expresso online:

«Só o orgulho visceral por um passado marítimo explica a compra dos submarinos.»

E no fundo, bem lá no fundo, ainda esperamos que o mundo venha a apreciar tanto rolhas de cortiça como gosta de petróleo. E lá iremos apregoar de novo que somos nós os maiores…
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2.3.11

A Alma


Um texto de Mia Couto

O país chorou e, com verdade, Malangantana. Todos, povo, partidos, governo foram verdadeiros na dor da despedida. Vale a pena perguntar, no entanto: fizemos-lhe em vida a celebração que ele tanto queria e merecia? Ou estamos reeditando o exercício de que somos especialistas: a homenagem póstuma? Quem tanto substitui pedir por conquistar acaba confundindo chorar por celebrar. E talvez o Mestre quisesse hoje menos lágrima e mais cor, mais conquista, mais celebração de uma utopia nova. Na verdade, Malangatana Valente Ngwenya produziu tanto em vida e produziu tanta vida que acabou ficando sem morte. Ele estará para sempre presente do lado da luz, do riso, do tempo. Este é um primeiro equívoco: Malangatana não tem sepultura. Nós não nos despedimos.

Existe, na verdade, um outro equívoco. E o logro pode ser este: Malangatana não foi apenas um grande artista. Ele foi a alma de um país. Foi alma de todos nós, Moçambique e moçambicanos. Através dele fizemo-nos ser escutados como gente, capaz de ter rosto e nome, capaz de sonhar.

O pintor resgatou e colocou não apenas em tela, mas em toda a sua vida, aquilo que eram os nossos quase sempre atabalhoados sonhos, povoados mais de monstros do que luminosas certezas. Malangatana fez por Moçambique o que todas as embaixadas do país juntas não fizeram. Não se trata aqui de menorizar o trabalho diplomático, certamente intenso e árduo. Trata-se sim de entender o quanto pode a arte como linguagem universal e como veículo de afirmação e dignidade de um povo.

O que estamos celebrando, mais do que um exímio artista, é a sua dimensão humana feita de afecto, verdade e universalidade. Mais do que um homem de cultura, ele foi um homem de culturas. A sua individualidade construiu-se na pluralidade. A necessidade dessa pluralidade é, talvez, a mensagem mais importante que ele nos deixa. Num momento em que vivemos uma versão única da nossa própria história, num momento em cresce a tentação de um pensamento único, esse legado do Mestre torna-se quase uma urgência. A diversidade é o maior alimento da alma humana. Tendo militado politicamente, não foi nunca um político. Não fez favores de conveniência, não se converteu num funcionário, num yes man cultural. A lógica dos seus quadros, mesmo quando ele se entregou à luta política, não foi subordinada a qualquer simplificação ao serviço da causa. O que ele nos revela, na sua pintura, foi o invisível. Tendo sido todos os outros, o que ele mais foi, foi ele mesmo.

(Continuar a ler)
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Meninos roubados


Cheguei lá através da «Asociación Memoria Histórica LasCabezas» no Facebook, e lê-se como uma novela de terror: em Espanha, muito para além do fim da Guerra Civil, mesmo depois do franquismo que terminou em 1975, pelo menos até à década de 80, roubavam-se crianças para adopção nas maternidades, dando-as como mortas para os pais - com a cumplicidade de médicos, enfermeiras, padres, freiras e advogados.

As primeiras denúncias apareceram em 2009 e os casos estão agora a ser investigados pela Fiscalía General del Estado – mais de 500, tanto quanto se sabe até ao momento. Um pouco por toda a Espanha, de Bilbao a Cádiz, passando por Madrid, Barcelona, Múrcia, Saragoça, Burgos, Tenerife, etc., etc. Absolutamente inacreditável!

Ler, para crer, a descrição de alguns casos. Não há dúvida que a humanidade é capaz das piores barbaridades.


Na Argentina, o mesmo drama:


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Agora Angola?


Parte do texto da convocatória para a manifestação contra o governo angolano, programada para 7 de Março:

ANGOLA

O povo da República de Angola diz basta ao regime ditador de Presidente José Eduardo dos Santos, que está no poder por 32 anos.

Os angolanos estão cansados da pobreza extrema, da cultura de medo e intimidação, da miséria, da autocracia e outros males introduzida por José Eduardo dos Santos.

O nosso país é conhecido pela sua riqueza em termos de recursos naturais e é classificada como a maior exportação de petróleo em África, mas o povo angolano vive com menos de 1 dolares americano por dia e com um governo que promove uma cultura de perpetuação da pobreza extrema.

Condenamos e denunciamos o cancelamento do nosso direito constitucional e democrático de eleger um Presidente de nossa escolha em cada quatro anos.

Queremos assumir o controle de nossas vidas, nosso país e os nossos recursos, mas em primeiro lugar queremos retirar o regime ditatorial de José Eduardo dos Santos.

A NOSSA PETIÇÃO
O povo angolano exige:

1 - A saída imediata do Presidente ditador José Eduardo dos Santos, seus ministros e companheiros;
2 - A formação de uma nova ordem política, social e económica;
3 - A re-implementação das Eleições Presidenciais periódicas em nossa Constituição;
4 - A implementação de uma democracia social, que deve ter o interesse do povo angolano de coração;
5 - A formação de um novo governo com os interesses do povo angolano de coração;
6 - O estabelecimento de um sistema de administração pública transparente e responsável de todos os recursos de Angola;
7 - A priorização dos cidadãos angolanos sobre os benefícios e reconstrução social de Angola.

A manifestação anti-governamental em Angola vai começar as zero horas na segunda-feira, dia 7 de Março de 2011, de Cabinda a Cunene.

CONCTACTE-NOS:
1 - Envia seus comentários e sugestões para o nosso endereço de e-mail: revolucao.angolana@yahoo.com;

Por: Agostinho Jonas Roberto dos Santos
Fundador do novo Movimento Revolucionário do Povo Lutador de Angola (MRPLA).

(Daqui)

Entretanto, o MPLA anunciou uma "marcha patriótica", a realizar no dia 5, em resposta a esta convocatória e parece estar «nervoso».
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Happy birthday…


Faz hoje 80 anos, chama-se Mikhail Gorbatchov e é tema de muitos artigos publicados um pouco por todo o mundo – poucos no seu país, diga-se. Porque, na Rússia, haverá sem dúvida alguns elogios, mas segundo leio, reina sobretudo a indiferença em relação ao seu papel (47% dos russos), pouco respeito ou gratidão (10%) e ainda menos simpatia (apenas 5%).

Entre muitos textos possíveis, leia-se o que José Milhazes publicou no seu blogue - O homem que mudou o mundo faz 80 anos – e, em El País, Mijaíl Gorbachov: año ochenta.

É obviamente muito complexo o estado actual da Rússia, e tudo o que tem pela frente para o ultrapassar, mas culpar Gorbatchov de todos os males é não só totalmente injusto mas também errado, como Pavel Palazhchenko o explica muito claramente:

«The disparity in how Gorbachev is perceived in Russia and in most other countries is undoubtedly a problem – not Gorbachev’s problem but Russia’s. Closing the gap with the rest of the world in the assessment of this man’s role in history would be a huge step in Russia’s integration with the global community.

But it cannot happen by itself. For it to happen, Russia needs another attempt at building a real democracy. Success is not guaranteed. The leader who takes this step will have a difficult time, but his task will be much easier than the one faced by Gorbachev, who initiated these reforms in a unique country that none of us really understood. Today, we are not quite as unique and that is likely a good thing. We are searching for the path to democracy along with dozens of other countries and hundreds of millions of people. And having traveled this path, we will be able to properly appreciate the person who gave us this chance.»
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Um regresso

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É só para avisar que o «bem haja» regressou. O José Carlos Mégre também e explica como:

«Pósmodernamente, estou – como convém – mais atomizado, mais hedonista, mais reaccionariamente revolucionário, enquanto o país caminha deficitariamente para o kaos, com assessoria do bloco de esquerda, sob ofício socialista e com o laranginha de sacristão. Os outros dois assistem, lavando as mãos em gamela de pedra pomes, que nos tempos que correm sempre tem água e cheiro a jasmim.»
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Rebobinar 46 anos


Serge Gainsbourg em 1965, antes dos muitos litros de alcool e das várias toneladas de cigarros dos anos que se seguiram. Morreu há 20 anos, em 2 de Março de 1991.


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1.3.11

E do outro lado do Atlântico…


A espectacularidade de tudo o que se passa mais perto de nós (o Mediterrâneo é mesmo ao virar da esquina…) tem deixado em segundo, ou mesmo terceiro plano, o que se passa em Wisconsin, algures no Norte da América.

E, no entanto, estas declarações de Noam Chomsky dão que pensar:

«In Egypt the working people are fighting to gain rights. In Wisconsin, in the richest country in the world, the working people are struggling to defend rights that are being destroyed and it's the Egyptians expressing solidarity with us...»



(Chomsky também, numa longa entrevista, em que fala de Wisconsin e não só - parte 1 e parte 2.


Este vídeo de anteontem fala por si.




E vale a pena ler um longo texto de Paul Krugman, publicado no New York Times - «A disputa pelo poder em Wisconsin».

«Na semana passada, diante das manifestações de protesto contra o novo governador antissindical de Wisconsin, Scott Walker – manifestações que prosseguiram no fim de semana, com grandes multidões no sábado – o deputado Paul Ryan fez uma comparação não intencionalmente adequada: “É como se o Cairo tivesse se mudado para Madison”.

Não foi a coisa mais inteligente para Ryan dizer, já que provavelmente não queria comparar Walker, um companheiro republicano, a Hosni Mubarak. Ou talvez quisesse –afinal, um bocado de conservadores proeminentes, incluindo Glenn Beck, Rush Limbaugh e Rick Santorum, condenou o levante no Egito e insistiu que o presidente Barack Obama deveria ter ajudado o regime de Mubarak a reprimi-lo.

De qualquer forma, Ryan estava mais certo do que imaginava. Pois o que está acontecendo em Wisconsin não envolve o orçamento estadual, apesar do faz de conta de Walker de que está apenas tentando ser fiscalmente responsável. Trata-se sim de disputa de poder. O que Walker e aqueles que o apoiam estão tentando fazer é tornar Wisconsin – e posteriormente os Estados Unidos – menos uma democracia funcional e mais uma oligarquia ao estilo do Terceiro Mundo. E é por isso que qualquer um que acredite que precisamos compensar o poder político das grandes corporações deve ficar ao lado dos manifestantes.»

(Continuar a ler aqui.)
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Ontem, toda ela se deixou ir


Ainda a propósito da morte de Annie Girardot, um belo texto de Ferreira Fernandes, hoje no DN.

A memória que não perco dela

Ontem, morreu uma das mulheres da minha vida, Annie Girardot. Tive um caso com ela, já o contei há anos numa crónica. Eu tinha 13 anos. Ela nunca soube de nada mas eu chegava para manter a nossa paixão: numa semana vi por três vezes Rocco e os seus Irmãos. A Girardot foi a única mulher de lábios finos que eu amei. Tudo por causa dos seus olhos que riam e da voz grave, a mais bela do cinema (igual só a de outra francesa, Jeanne Moreau). Embora nada sabendo de mim, ela atiçou-me as esperanças. Os jornais contaram que se apaixonou por Renato Salvatori, cara de homem, o boxeur irmão de Rocco. Tivesse ela escolhido Rocco (o bonitinho Alain Delon), eu ficava a saber que eu não teria chances. Há poucos anos, por um comovedor livro da sua filha Giulia Salvatori, A Memória da minha Mãe, eu soube que ela tinha Alzheimer. Um dia, ao entrar num barco para a Sardenha, ela disse: "Não sei subir." Eram simples escadas. Em 2006, filmou o anúncio da sua doença: "Meus amigos, um pouco de mim vai deixar--vos." Em 2008, para um documentário, amigos levaram-na à Place des Vosges, em Paris. Sentada num banco de jardim, foi saudada por vizinhos que a sabiam doente. "Ah, bon...", ainda disse com a sua bela voz. De repente, o seu olhar, o tal outrora provocador, partiu para dentro dela. Esquecera tudo, até a câmara que a filmava. Ontem, aos 79 anos, toda ela se deixou ir.
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Ide e lede


... o que Sérgio Lavos escreveu no Arrastão sobre o Prós & Contras de ontem - está lá tudo. Cheguei a casa a meio do programa (hei-de ver o resto online, mesmo com sacrifício…), mas aquilo a que assisti foi absolutamente lamentável.

Fátima Campos Ferreira, cada vez mais arrogante, julga ter o país nas mãos e as soluções na algibeira. E não o escondeu ontem, uma vez mais. Pelo meio, foi dizendo aos jovens frases como esta que Medeiros Ferreira registou: «Você não é político, espero!»

Comentários para quê. Apenas um: o que ela ganha sai directamente dos nossos impostos.
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Muito melhor do que ouvir o P&C

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28.2.11

Uma desfeita para a Drª Fátima Campos Ferreira

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Com o meu aplauso:

Resposta ao convite do programa Prós e Contras – RTP
Exmos. Srs.,

Vimos pelo presente agradecer o vosso convite a participar no próximo programa Prós e Contras.

Entendemos, no entanto, não ser oportuno aceita-lo. Não nos consideramos representantes, muito menos líderes, de qualquer movimento e, ainda menos, de toda uma geração.

Até agora, 30.000 pessoas já aderiram, no facebook, ao Protesto da Geração À Rasca e estamos cada vez mais certos que, centrar o protagonismo numa ou nalgumas pessoas, só porque estão a dinamizar o evento, será extremamente redutor, tendo em conta a transversalidade do problema e a diversidade de situações de precariedade existentes.

Acreditamos também que, infelizmente, não vos será difícil encontrar testemunhos pessoais sobre diversos tipos de precariedade que afectam, não apenas os jovens, mas toda a sociedade portuguesa.

Agradecemos encarecidamente a vossa compreensão.

Disponibilizamo-nos também para vos prestar todas as informações, acerca da organização do Protesto, de que venham a necessitar futuramente.

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Annie


Tinha 79 anos e morreu hoje - Annie Girardot, a belíssima prostituta de «Rocco e os seus irmãos», de Luchino Visconti, e de dezenas de outros filmes inesquecíveis.

No dia em que o mundo inteiro fala de cinema, depois de uma noite em feira de vaidades que me deixou gelada e totalmente indiferente, é um pouco do meu passado que desaparece com uma das maiores actrizes francesas do século XX. Tanto mais cruelmente quando se sabe o que foram os seus últimos anos, semi-perdida no Alzheimer que a foi destruindo e pelo qual deu a cara em «Ainsi va la vie», de Nicolas Baulieu.






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Um prémio


Alegria em duplicado, quando um belo prémio é atribuído a um livro de um grande amigo.



Na foto, o abraço de Luís Sepúlveda (também visível no vídeo, na primeira fila da plateia) a Pedro Tamen, grande tradutor de muitas das suas obras.

(Via Bibliotecário de Babel)

Um longo casaco de veludo azul
cobrirá um dia a madrugada que fabrico
dia por dia, mastigando os minutos
nos gestos destas mãos.
E ficará perfeita a vida que sufoco
nesta cave insalubre,
na penumbra habitada.
(poema 32, Livro do Sapateiro)
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Cada um viu Tahrir como quis


Pensei o mesmo que Miguel Madeira quando li este parágrafo de um artigo de Pacheco Pereira, editado primeiro no Público (em 19 de Fevereiro!...) e depois no Abrupto. Certamente que não viu a mesma Praça Tahrir que o resto da humanidade, em dezenas de vídeos, ou só olhou para uma ou outra fotografia como a deste post.

«É por isso que uma das coisas que não encaixavam na narrativa sobre a revolta árabe era ver a multidão na Praça Tahrir a rezar. Não que a fé e a oração públicas sejam por si só incompatíveis com a laicidade de um Estado, mas porque não havia excepções na muralha de corpos prostrados. Não havia cristãos na multidão, não havia um ateu, um agnóstico, alguém que não fosse religioso, e permanecesse de pé ou à margem da oração?»

Bem a propósito (ou de propósito?), Paulo Moura publicou um belíssimo texto na Pública de ontem:

Em Tahrir nem todos rezavam

Na praça Tahrir nem todos rezavam. Fazia-o quem queria, o que nunca foi a maior parte dos milhares de manifestantes. Há muitos egípcios muçulmanos que, cinco vezes por dia, fazem as orações prescritas pelo Corão. Quer estejam na praça Tahrir, quer noutro lugar qualquer. Outros egípcios muçulmanos só fazem as orações à sexta-feira, outros fazem-nas raramente, outros não as fazem nunca.

Não sei quais são as percentagens de uns e outros, nem a relação desses números com a classe social de cada um, a idade ou a região de onde provêm. Também não sei qual é a percentagem de portugueses que reza antes do deitar, e se isso depende da classe, idade ou região. Também ignoro se há estudos rigorosos sobre o número de portugueses que, nos anos 50, rezavam antes de dormir e de comer. E, desses, quantos ainda o fazem. E se os seu filhos o fazem. E os netos.

Também não sei qual é a percentagem de cidadãos dos EUA que rezam. E a dos que têm uma Bíblia à cabeceira, e a dos frequentam bruxos, videntes e "psíquicos". Já agora, também não sei o número de portugueses que o fazem.

Perdi a conta ao número de séculos durante os quais os padres cristãos impuseram às pessoas padrões de comportamento. Aliás, não sei bem quando deixaram de o fazer, nem o que ainda fariam se os deixassem.

Não sei quem disse aos muçulmanos que os judeus eram perversos, que o Ocidente conspira, as mulheres devem obedecer aos homens e os não-crentes são seres inferiores. Também não contei quantos milhões pereceram às mãos dos cristãos por serem infiéis, nem quantas mulheres da Cristandade nasceram e morreram sem terem tido vida.

Não investiguei se alguém violou uma jornalista americana na praça Tahrir, ou noutra qualquer praça ou rua do Cairo ou de Aveiro. Nem se o violador apoiava o não Mubarak, era devoto de Maomé ou da Virgem de Fátima, votava no PSD ou no Bloco. Em nenhum dos casos concluiria que a base de apoio do PSD são os violadores, que os bloquistas são frustrados sexuais ou que a vocação dos católicos é estuprar mulheres estrangeiras.

Não sei se há mais crime no mundo islâmico, judaico, cristão ou hindu, nem se há mais frustrações sexuais nos países do Norte ou do Sul, se há relação entre culpa e prosperidade económica, nem se a violência é mais própria dos climas quentes ou frios, ou a indolência directa ou inversamente proporcional à distância da praia.

O que eu sei é que na praça Tahrir nem todos rezavam. Sei, porque estive lá durante 21 dias seguidos. À hora da oração, organizava-se um cordão humano, de mãos dadas, para dar espaço a quem queria rezar. Faziam-no em conjunto, como é hábito entre os muçulmanos. Mas bastava olhar para o lado para ver a multidão que continuava de pé, a conversar. E também os grupos de cristãos que oravam juntos. Era assim, por mais que isto desoriente, incomode e fira a narrativa racista.

É admirável a capacidade humana de construir narrativas. Mas ainda mais a sua aptidão para as rasgar quando já não lhe servem. Leva tempo, porque a História mental é de longa duração. Mas não há nenhuma prova de que as civilizações árabe e muçulmana sejam incompatíveis com a democracia. Não há nada nos árabes e muçulmanos - nem a História, nem a tradição, a geografia, os textos sagrados ou o genoma - que os impeça de serem livres. O único impedimento seria não quererem, e a única ajuda que o Ocidente lhes pode dar é acreditar neles.
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Dia e noite

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(Via Elísio Estanque no Facebook)
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27.2.11

E depois do Mediterrâneo?


Quando olhámos horas e horas para a Praça Tahrir, ou quando nos mostram agora imagens de todas as manifestações, de Marrocos ao Bahrein, vemos jovens, jovens e mais jovens.

Se é sabido, em termos gerais, que a taxa de natalidade nestes países é elevada, outra coisa bem diferente é ler essa realidade reflectida nalguns números: cerca de 60% da população do Médio Oriente e do Norte de África tem menos de 30 anos e a idade média situa-se à volta de 25 (19, no caso extremo do Iémen), como resultado de um verdadeiro boom demográfico que teve lugar a partir de meados da década de 80. Nos últimos 30 anos, o analfabetismo entre os jovens foi drasticamente reduzido de 42 para 10% e o acesso às universidades largamente facilitado (*).

Tudo boas notícias? Sim mas não inteiramente, já que, apesar de registarem um índice de crescimento económico relativamente elevado, estes países não se adaptaram a novas exigências e foram incapazes de integrar as multidões de jovens que foram chegando ao mercado de trabalho. Tudo isto teve também como resultado que a permanência de ditaduras se tornou insuportável para sociedades renovadas, muito mais instruídas e com um acesso crescente, mesmo que limitado, ao mundo global.

O que está agora a acontecer na bacia do Mediterrâneo chegará a outras paragens por contágio ou, pura e simplesmente, por analogia. Estou a pensar, por exemplo, no Sudoeste Asiático, certamente com condições políticas e culturais muito diferentes, mas também com taxas de natalidade elevadas, populações impressionantemente jovens e regimes mais ou menos autoritários. Se há 16% de portugueses com 14 anos ou menos, e se o valor dessa percentagem é 32 no caso do Egipto, sobe para 33 no Cambodja e para 41 no Laos, só para citar dois exemplos onde os reflexos destes números se «vêem» a cada esquina.

Alguém acredita que os quase 5 milhões de cambojanos, nascidos desde 1997, não vão revoltar-se se tiverem no horizonte trabalhar, como os seus pais, 364 dias por ano, sem horários e com ordenados de miséria? Claro que não. Espero que não. E o Ocidente que se cuide.

(*) Fonte
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Da brutalidade

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Entretanto, no Irão.

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Interrogações


(Via Mª Evangelina Silva no Facebook)
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E Fidel não desarma


Dois dias depois de uma primeira intervenção, uma outra na passada quinta feira. Em suma:

«Los medios masivos del imperio han preparado el terreno para actuar. Nada tendría de extraño la intervención militar en Libia, con lo cual, además, garantizaría a Europa los casi dos millones de barriles diarios de petróleo ligero.»

«El Presidente de Estados Unidos habló en la tarde de este miércoles y expresó que la Secretaria de Estado saldría para Europa a fin de acordar con sus aliados de la OTAN las medidas a tomar. En su cara se apreciaba la oportunidad de lidiar con el senador de la extrema derecha de los republicanos John McCain; el senador pro israelita de Connecticut, Joseph Lieberman y los líderes del Tea Party, para garantizar su postulación por el partido demócrata.

Los medios masivos del imperio han preparado el terreno para actuar. Nada tendría de extraño la intervención militar en Libia, con lo cual, además, garantizaría a Europa los casi dos millones de barriles diarios de petróleo ligero, si antes no ocurren sucesos que pongan fin a la jefatura o la vida de Gaddafi.
De cualquier forma, el papel de Obama es bastante complicado. ¿Cuál será la reacción del mundo árabe y musulmán si la sangre en ese país se derrama en abundancia con esa aventura? ¿Detendrá una intervención de la OTAN en Libia la ola revolucionaria desatada en Egipto?

En Iraq se derramó la sangre inocente de más de un millón de ciudadanos árabes, cuando el país fue invadido con falsos pretextos. ¡Misión cumplida! proclamó George W. Bush.

Nadie en el mundo estará nunca de acuerdo con la muerte de civiles indefensos en Libia o cualquier otra parte. Y me pregunto: ¿aplicarán Estados Unidos y la OTAN ese principio a los civiles indefensos que los aviones sin piloto yankis y los soldados de esa organización matan todos los días en Afganistán y Pakistán?

Es una danza macabra de cinismo.»

(Na íntegra aqui.)
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