8.5.12

Grécia: por um prato de lentilhas?



Antonis Samaras, chefe da Nova Democracia, começou por contactar Alexis Tsipras, líder do Syriza, numa proposta formal de coligação para a formação do novo governo grego. Com 108 + 52 deputados, esta seria a única combinação, a dois, que garantiria uma maioria parlamentar (conseguida com metade do número total +1, ou seja 151). 

Como era esperado, Tsipras recusou, as outras iniciativas de Samaras falharam e a estafeta passou para o líder do Syriga. Ninguém crê que ele ou quem se lhe segue (o responsável pelo PASOK) tenham mais sucesso e a Grécia encaminha-se, inevitavelmente, para novas eleições. 

Entretanto, já hoje, Tsipras «descartou a participação de seu partido numa coligação que apoie os ajustes impostos pela União Europeia e o FMI». 

Ainda não li preto no branco, mas já vi e ouvi insinuar, que Tsipras não devia fazê-lo, mas sim renunciar às suas posições de recusa do Memorando, em nome de uma sacrossanta «salvação nacional». E bater-se depois, no Parlamento, com outras forças de esquerda, para amenizar as condições de cumprimento. Mais: que será ele a ficar com o odioso, a «culpa» principal do caos que se anuncia. (Em suma, argumentos semelhantes àqueles dos que ainda hoje condenam a nossa esquerda por não ter aprovado o PEC IV – tinham de vir esses argumentos, era fatal como o destino…) 

Entretanto: 

- É bom recordar que a maioria esmagadora de quem foi votar no Domingo castigou duramente os dois partidos austeritários que têm alternado no governo do país. Aquilo a que assistimos foi «uma rebelião democrática contra um ajuste excessivamente duro», o que não deve ser interpretado como desejo em sair do euro, que é rejeitado pela maioria da população» e também pelo Syriza. Mas não só: rebelião também contra os políticos que governaram o país nos últimos anos e que «sacrificaram o bem-estar público a ganhos políticos e mesmo pessoais»

- Tudo será / já está a ser feito para amedrontar os eleitores: «O Estado grego poderá ficar sem dinheiro no final de Junho se do resultado das eleições não sair um governo sólido e disposto a executar o programa de ajustamento da troika, admitiram ontem três membros do Ministério das Finanças grego.» Serão usadas todas as armas para «recentrar» os votos, em nome da luta contra o caos. Mude-se o povo...

A questão que se põe a partir de agora é a de saber se os gregos terão forças para resistir (porque é de resistência que se trata), mantendo uma posição claramente anti-austeritária nas eleições que se seguem, provavelmente já em Junho. Se a resposta for positiva serão heróicos, como tantas vezes na sua História! Caso contrário, quem for capaz que lhes atire a primeira pedra. Mas continuo a esperar – por eles, por nós, pela Europa – que não troquem a honra e a dignidade por um prato de lentilhas. Mesmo que a fome seja maior que a de Esaú.

*****
P.S. - Já são públicos os cinco requisitos mínimos definidos pelo Syriza para participação no governo na Grécia:
1) Imediato cancelamento de todas as medidas pendentes de empobrecimento, como cortes nas pensões e salários.
2) Cancelamento de todas as medidas pendentes que vão contra os direitos fundamentais dos trabalhadores, como a abolição dos contractos colectivos de trabalho.
3) Abolição imediata da lei garantindo imunidade aos deputados e reforma da lei eleitoral (principalmente a questão dos 50 deputados bónus para o partido vencedor).
4) Investigação aos bancos gregos e imediata publicação da auditoria feita ao sector bancário pela BlackRock.
5) Uma comissão de auditoria internacional para investigaras causas do défice público da Grécia, com uma moratória em todo o serviço de dívida até serem publicados os resultados da auditoria.
 .

2 comments:

Anónimo disse...

A coligação chama-se Syriza, sigla de Synaspismós Rizospastikís Aristerás.

Joana Lopes disse...

Obrigada, vou corrigir. Uma das referências tem uma gralha.