13.9.14

Um pequeno absurdo



Passando por acaso por este texto de Alexandre O'Neill, lembrei-me dos nossos pequenos absurdos de cada dia, desde a telenovela do Novo ex-BES (ou do ex-Novo BES, já nem sei), ao fenómeno Marinho e Pinto, aos debates entre aqueles dois camaradas de partido, que tanto se amam. E de nós que cá vamos andando, com a cabeça entre as orelhas – como canta o outro.

Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja,
que o absurdo, mesmo em curtas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!
Se é verdade o aforismo faca afia faca
(não sabemos falar senão figuradamente
sinal de que somos pouco capazes de abstracção).
Se faca afia faca,
então que a faca do absurdo
venha afiar a faca da nossa embotada vontade,
venha instalar-se sobre a lâmina do inesperado
e o dia a dia será nosso e diferente.
Aflições? Teremos muitas não haja dúvida.
Mas tudo será melhor que este dia a dia.
Os povos felizes não têm história, diz outro aforismo.
Mas nós não queremos ser um povo feliz.
Para isso bastam os suíços, os suecos, que sei eu?
Bom proveito lhes faça!
Nós queremos a maleita do suíno,
a noiva que vê fugir o noivo,
a mulher que vê fugir o marido,
o órfão que é entregue à caridade pública,
o doente de hospital ainda mais miserável que o hospital
onde está a tremer, a um canto, e ainda ninguém lhe ligou
nenhuma. Nós queremos ser o aleijado nas ruas, a pedir esmola, a
a bardalhar-se frente aos nossos olhos. Queremos ser o pai
desempregado que não sabe que Natal Dai-nos, meu Deus…
há-de dar aos seus.
Garanti-nos, meu Deus, um pequeno absurdo cada dia.
Um pequeno absurdo às vezes chega para salvar. 
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Desde Bento XVI



... que os Bentos caem que nem tordos. Mas ainda falta S. Bento, claro. 
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Crítica da razão impura



Este texto de João Caraça, do Público de ontem (12:09:2014), é demasiado importante par desaparecer no labirinto dos links perdidos ou inacessíveis para a maioria (sem que isso signifique que concorde com tudo o que nele é escrito). Os realces são meus.

«Não se pode duvidar de que todos os nossos conhecimentos começam com a experiência, são as palavras com que Immanuel Kant inicia o seu monumental tratado publicado em 1781. 'A experiência é madre das cousas…' já lembrava o grande universalista Duarte Pacheco Pereira nos dias venturosos de 1508. Devemos pois considerar seriamente a experiência.

De facto, a experiência que estamos a viver nesta crise prolongada tem-nos ensinado e feito reflectir muito sobre o estado das coisas neste mundo. Um estado a que presentemente assiste uma razão muito impura. Porque não acredito que os males que nos afligem sejam apenas obra e graça dos Espírito Santos.

Fomos fracos. Ano após ano, década atrás de década de propaganda sistemática e envolvente levaram-nos a não querer ver nos Estados Unidos o centro de uma organização hegemónica quase-imperial – que ordenou o sistema-mundo durante a maior parte do século XX – e a não aceitar os europeus ocidentais como seus satélites. Não, nós éramos os ‘aliados’. Satélites eram os países do leste europeu em relação à União Soviética. E como num filme, assistimos de olhos esbugalhados à implosão do ‘império’ soviético, de cujo fragor ideológico a esquerda ainda não se recompôs. Porém a Rússia continua a desempenhar um papel de peso na cena internacional, embora com outros contornos.

Apelidar as nossas sociedades de capitalistas era coisa que parecia mal, que só podia significar apoio à causa do comunismo internacional, enfim, ao diabo! Era uma traição à ordem democrática do nosso mundo. E, no entanto, o capitalismo não é apenas um regime do poder económico como nos quiseram impingir mas sim uma verdadeira ordem social institucionalizada, tal como o feudalismo de outros tempos. Tanta foi a propaganda e a desinformação que ainda nos custa admitir que o sistema-mundo em que vivemos desde o século XVII e que tantas glórias (e desgraças) trouxe às Europas foi impulsionado pela acumulação consentida de capital. O capitalismo é um produto histórico, como todas as outras estruturas e instituições que os humanos criaram e utilizaram. Assim como teve um começo, terá um fim.

12.9.14

Mas o que é isto???




Nem sou capaz de comentar!

(Regressa, «Menino Guerreiro», estás perdoado.)
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Amílcar Cabral, 90 anos



Nasceu na Guiné (Bafatá), em 12 de Setembro de 1924, fez  o liceu em Cabo Verde, veio mais tarde para Lisboa onde se licenciou em Agronomia. Em 1956 foi um dos fundadores do PAIGC, partido que liderou e que, em Janeiro de 1963 declarou guerra contra o colonialismo de Portugal. Dez anos mais tarde, em 20 de Janeiro de 1973, assassinaram-no em Conacri.

Foi precisamente na Guiné Conacri que lhe foi feita esta entrevista, em 11/11/1969:



Vale a pena percorrer um riquíssimo arquivo, disponibilizado na internet desde Janeiro do ano passado, depois de recuperado e tratado pela Fundação Mário Soares, a pedido das autoridades guineenses e caboverdeanas e com o especial empenho de Aristides Pereira, Iva Cabral e Pedro Pires. Encontra-se agora na «Casa Comum», site criado por aquela Fundação, e pode ser consultado a partir daqui.

Em Angola, Cabo Verde e Guiné celebra-se a data de hoje. Em Portugal? Não encontrei nem uma referência... 
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Quando alguém nos recorda


... que a presidente do Federação Europeia dos Bancos Alimentares é esta senhora, confirmamos que o mundo vai mal.

O nosso investigador Moedas



«Há quem diga que Carlos Moedas foi uma figura insignificante no círculo de poder de Pedro Passos Coelho. Não foi. Ele foi determinante no círculo de influência do FMI, da UE e do BCE.

Não apenas como tradutor, mas também como instigador de medidas que iam para além da troika. Foi o químico e o físico da troika. Tornou-se um cientista de almas. Foi um pequeno Lavoisier: "Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". Conseguiu isso: nada criou, nada perdeu e conseguiu ajudar a transformar uma grande dívida pública numa maior, um desemprego cómodo num desemprego brutal e uns impostos fartos nuns impostos insuportáveis.

Carlos Moedas foi o Sherlock Holmes indígena. Olhando para a sociedade respondia simplesmente: "Elementar, meu caro Watson". Para Carlos Moedas tudo é elementar, porque já foi criado e está sistematizado numa folha de Excel. Por isso foi promovido para a Europa, seguindo a rota de tantos que foram premiados pelo seu excesso de competência. (...)

Como se sabe, no mundo da burocracia de Bruxelas, a maior parte dos comissários são bonecos de cera, que depois de vistos, seguirão para o museu Madame Tussaud. Carlos Moedas terá aí, um dia, o seu grande momento de glória.»

Fernando Sobral

11.9.14

Lido por aí (111)


@João Abel Manta

* A metamorfose (Bernardo Pires de Lima)

* Europe's Deadly Borders: An Inside Look at EU's Shameful Immigration Policy (Maximilian Popp)

* Podrá Podemos? (Antonio Estella)
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O voto dos socialistas mortos



Ricardo Araújo Pereira, hoje absolutamente hilariante, numa carta que um socialista defunto escreve ao presidente da Federação do PS de Braga:

«Na qualidade de socialista falecido em 2005, venho felicitar a sua federação por possibilitar a participação de mortos no processo eleitoral. (...)
Os mortos nunca tiveram representação política. O falecimento, ocorrência tantas vezes alheia à vontade do cidadão, retira-lhe o direito de voto, sem que seja apresentada uma justificação válida. A ausência de actividade cerebral não serve de desculpa, uma vez que também se verifica, quer em outros eleitores, quer em boa parte dos eleitos. (...)
Somos muitos, neste lado, a querer participar. E está aqui um senhor chamado Engels que quer dar uma palavrinha a V. Exa. acerca do que é, na verdade, um partido socialista.»

Na íntegra, AQUI.
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11 de Setembro, ainda – 1973 / 2001



No 1º aniversário da queda da Torres Gémeas, foram convidados onze realizadores para fazerem filmes dedicados ao acontecimento. Ken Loach estabeleceu um paralelo com um outro 11 de Setembro, o de 1973 no Chile.


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O último discurso de Salvador Allende



Salvador Allende afirmou, bem antes de 11 de Setembro de 1973, que estava a cumprir um mandato dado pelo povo e que só sairia do palácio depois de o cumprir. Ou que o faria «com os pés para diante, num pijama de madeira». Assim aconteceu. Soube-se mais tarde que se suicidou durante o ataque ao Palácio de la Moneda, em Santiago do Chile.

Depois, foi o que é conhecido: 30.000 chilenos foram assassinados durante o regime de Pinochet.



Porque o sim do vídeo não tem grande qualidade, fica o texto:

«Seguramente ésta será la última oportunidad en que pueda dirigirme a ustedes. La Fuerza Aérea ha bombardeado las torres de Radio Postales y Radio Corporación.

Mis palabras no tienen amargura sino decepción. Que sean ellas un castigo moral para quienes han traicionado su juramento: soldados de Chile, comandantes en jefe titulares, el almirante Merino, que se ha autodesignado comandante de la Armada, más el señor Mendoza, general rastrero que sólo ayer manifestara su fidelidad y lealtad al gobierno, y que también se ha autodenominado director general de Carabineros.

Ante estos hechos sólo me cabe decir a los trabajadores:

¡Yo no voy a renunciar!

Colocado en un tránsito histórico, pagaré con mi vida la lealtad del pueblo. Y les digo que tengo la certeza de que la semilla que hemos entregado a la conciencia digna de miles y miles de chilenos, no podrá ser segada definitivamente.

Tienen la fuerza, podrán avasallarnos, pero no se detienen los procesos sociales ni con el crimen ni con la fuerza. La historia es nuestra y la hacen los pueblos.

Trabajadores de mi patria: Quiero agradecerles la lealtad que siempre tuvieron, la confianza que depositaron en un hombre que sólo fue intérprete de grandes anhelos de justicia, que empeñó su palabra en que respetaría la Constitución y la ley, y así lo hizo.

En este momento definitivo, el último en que yo pueda dirigirme a ustedes, quiero que aprovechen la lección: el capital foráneo, el imperialismo, unidos a la reacción, crearon el clima para que las Fuerzas Armadas rompieran su tradición, la que les enseñara el general Schneider y reafirmara el comandante Araya, víctimas del mismo sector social que hoy estará esperando con mano ajena reconquistar el poder para seguir defendiendo sus granjerías y sus privilegios.

Me dirijo a ustedes, sobre todo a la modesta mujer de nuestra tierra, a la campesina que creyó en nosotros, a la madre que supo de nuestra preocupación por los niños. Me dirijo a los profesionales de la patria, a los profesionales patriotas que siguieron trabajando contra la sedición auspiciada por los colegios profesionales, colegios clasistas que defendieron también las ventajas de una sociedad capitalista.

Me dirijo a la juventud, a aquellos que cantaron y entregaron su alegría y su espíritu de lucha. Me dirijo al hombre de Chile, al obrero que trabajó más, al campesino, al intelectual, a aquellos que serán perseguidos, porque en nuestro país el fascismo ya estuvo hace muchas horas presente en los atentados terroristas, volando los puentes, cortando las vías férreas, destruyendo los oleoductos y los gasoductos, frente al silencio de quienes tenían la obligación de proceder.

Estaban comprometidos. La historia los juzgará.

Seguramente Radio Magallanes será acallada y el metal tranquilo de mi voz ya no llegará a ustedes. No importa. La seguirán oyendo. Siempre estaré junto a ustedes. Por lo menos mi recuerdo será el de un hombre digno que fue leal con la patria.

El pueblo debe defenderse, pero no sacrificarse. El pueblo no debe dejarse arrasar ni acribillar, pero tampoco puede humillarse.

Trabajadores de mi patria, tengo fe en Chile y su destino. Superarán otros hombres este momento gris y amargo en el que la traición pretende imponerse. Sigan ustedes sabiendo que, mucho más temprano que tarde, de nuevo se abrirán las grandes alamedas por donde pase el hombre libre, para construir una sociedad mejor.

¡Viva Chile! ¡Viva el pueblo! ¡Vivan los trabajadores!

Estas son mis últimas palabras y tengo la certeza de que mi sacrificio no será en vano. Tengo la certeza de que, por lo menos, será una lección moral que castigará la felonía, la cobardía y la traición.» 
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10.9.14

PS, debate nº2



Quanto a conteúdo, estamos conversados... 
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E quanto a Carlos Moedas




Portugal conseguiu hoje a importante pasta da ciência e dos polvos que adivinham resultados do futebol na Comissão Europeia. Moedas passou a manhã a experimentar batas brancas e a escolher um microscópio no Toy’r’us. À hora de almoço comprou um acelerador de partículas do chinês por € 2,99. MB
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Lido por aí (110)


@João Abel Manta

* A nova guerra fria (Serge Halimi)

* «Quiero una Catalunya independiente y una España gobernada por Podemos» (Teresa Forcades)

* Draghi o el fracaso de Europa (Juan Torres López)
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António & António


«De facto, um e outro [Seguro Costa] não apresentam nem apresentarão qualquer projecto de redução da dívida, mesmo que reconheçam que o problema é colossal. E não o fazem pela simples razão de que entendem que o governo só pode obedecer a Berlim e portanto mais vale não prometer o que Merkel não autorizará. Querem cumprir o Tratado Orçamental custe o que custar e preparam-se para essa dolorosa tarefa.»  

Francisco Louçã

Governo marxista (segundo Groucho)



«O mistério do pragmatismo político foi, um dia, exemplarmente explicado por Groucho Marx: "Estes são os meus princípios; mas estou disposto a modificá-los". (...)

O Governo português, sabe-se, é marxista, na versão Groucho. Muda de princípios da mesma forma que muda de perfume. Chama a isso pragmatismo liberal. Há quem lhe chame o caos desorganizado. Freguês da dívida, Portugal está hoje refém do Tratado Orçamental, que prevê que cheguemos a 60% de dívida pública máxima e a 0,5% de défice do PIB. Uma miragem, todos sabem, já que mesmo com a austeridade a dívida continua a crescer e o crescimento económico é tão anémico que nem daqui a 50 anos pagaremos a dívida com estes juros. (...)

Quando 70 personalidades pediram há alguns meses a reestruturação da dívida, o Governo jurou que isso só aconteceria por cima do seu cadáver. Porque, segundo ele, isso devoraria a credibilidade do país. (...)

No fim-de-semana passado, Maria Luís Albuquerque, estrela em ascensão no PSD, abriu a janela para a corrente de ar: a questão da renegociação da dívida, afinal, deve ser debatida no Parlamento. Ou seja, os princípios de ferro do Governo são agora de manteiga. Porque a dívida não pára de crescer. As leis da política, sabe-se, fizeram-se para ser alteradas pela conjuntura eleitoral. E pelos sinais que vêm da sede do BCE. Mas o Governo escusava de ser afilhado de Groucho e mudar de princípios sem achar que, assim, deve levar pimenta na língua.»

Fernando Sobral

9.9.14

Balanço de um debate



«Ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!»
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As Cidades e as Praças (61)



Praça Raekoja (Talin, 2003)



(Para ver toda a série «As Cidades e as Praças», clicar na etiqueta «PRAÇAS».)
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Vem aí um «Novo BCE» com borboletas?

Culpas e culpados



Joaquim Aguiar, no Negócios de hoje, a propósito do caso Ricardo Salgado:

«Um dispositivo de defesa de que se podem servir as sociedades que mergulham numa crise de grande intensidade é a identificação de um bode expiatório, aquele que pode ser denunciado como o "culpado disto tudo" e cujo sacrifício, real ou ritual, constituirá a absolvição do colectivo: a acusação de um é a prova da inocência de todos. A sociedade poderá mudar de rumo e continuar sem ter de mudar os seus comportamentos, as suas expectativas e as suas estratégias – até à próxima crise de grande intensidade, onde se voltará a procurar o culpado disso tudo para que o colectivo possa continuar a dizer-se inocente.

É por a história de cada crise de grande intensidade ser mal contada que essas crises se repetem. Para que haja um culpado disto tudo, é preciso que muitos tenham colaborado e participado, mas também é preciso que a sociedade tenha convivido com tudo isto como se esta fosse a ordem natural das coisas. Quando se recorre ao dispositivo do bode expiatório é porque não se quer interpretar o que aconteceu.

A única defesa eficaz contra crises de grande intensidade é o regular funcionamento das instituições e, em primeira linha, a responsabilidade dos agentes políticos para manterem as sociedades dentro do seu campo de possibilidades. Quando os partidos do regime esquecem esta responsabilidade, abrem o caminho aos bancos do regime e aos homem-bomba: mas quem abre a porta tem mais culpa do que quem passa o pórtico das imparidades.»
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8.9.14

Memórias que regressam



Para mim, Jean Seberg ficou sempre com os 20 / 21 anos que tinha quando a vi em «Bonjour Tristesse», de Otto Preminger, mas sobretudo, sem qualquer espécie de dúvida, ao lado de Jean-Paul Belmondo no mítico «À bout de souffle», a primeira longa metragem de Jean-Luc Godard, baseada num roteiro de François Truffaut.



Um vídeo divulgado hoje no Facebook «devolveu-ma», não sei exactamente com que idade, mas provavelmente perto do fim, já que morreu pouco antes de completar 41 anos. Confesso que nem a reconheci.

O que só fiquei a saber hoje é que desde os 14 anos, ainda nos Estados Unidos, esteve ligada à defesa dos direitos dos negros e que, no fim dos anos 60, utilizou a celebridade que já tinha ao serviço de causas políticas como, por exemplo, a dos Panteras Negras. O FBI passou a controlá-la e o seu ex-marido Romain Gary atribuiu mesmo a essa perseguição e hostilidade o suicídio da actriz em Setembro de 1979.

Teria hoje 75 anos. Nunca a vimos, nem veremos, velha. 
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Lido por aí (109)

BES: nunca mais acaba o Estado Novo?



«Ainda ninguém falou de nada que se parecesse com o problema real que temos do BES, além do roubo perpetrado por um grémio de classes – de executivos, políticos e burguesitos de carro a leasing – associadas em regime de cleptocracia. Nunca mais acaba o Estado Novo? O BES é o retrato perfeito de uma sociedade de elites boçais, subsidiadas pelo horror à novidade, que herdámos da outra senhora.»

Nicolau do Vale Pais

PS: a guerra das vitórias



O espectáculo a que se assistiu este fim-de-semana, quando foram conhecidos os resultados dos actos eleitorais nas federações do Partido Socialista, seria simplesmente ridículo se não fosse também patético. De um lado da barricada reclama-se uma vitória 10-9 (federações), do outro também (maior número de votos). Tema transcendente, que deve ter tirado o sono a meia dúzia de devotos enquanto o país vociferava contra a Albânia e contra Paulo Bento.

Magérrimas vitórias, portanto, que adiam tudo para 28 de Setembro, onde se espera que os não militantes de um partido decidam o futuro do mesmo. Consta que já há mais de 55 mil «simpatizantes» inscritos e espera-se que não faltem à chamada. Mas, atenção, porque só quem não anda pela net ignora que a relação entre inscrições online e correspondentes presenças físicas nos acontecimentos é, ela também, magérrima: eventos com milhares de promessas de adesão saldam-se por dezenas de participantes envergonhados. Claro que a excepção poderá sempre confirmar a regra, mas...

E no dia 29 de Setembro? Será que «o PS vai emergir, seja qual for o resultado, exangue, dilacerado e ressentido», como defende Viriato Soromenho-Marques em artigo publicado hoje no DN? Há quem diga que sim, há quem defenda que não, que o dia seguinte será o regresso às declarações de unidade e à preservação, ou conquista, de uns lugarzitos ao Sol.

Seja como for, estes longos meses ficaram ao nível da pequena ou da grande intriga e não terão contribuído para a dignificação da política, nem para o despertar da luta de um povo sofredor mas mais ou menos anestesiado. Portugal, a Europa e o mundo no estado em que estão e querem que alguém se galvanize com estas guerras de alecrim e mangerona? 
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