27.1.15

Grécia. Nada será como dantes



«A Europa flácida e rica gosta de se comportar como uma Cassandra da idade moderna: passou os últimos tempos a alertar para a destruição da Grécia se o Syriza ganhasse as eleições.

Como se não tivesse sido a mentalidade feudal do poder europeu de Bruxelas e Berlim que conduziu os gregos para um voo de Ícaro porque em terra já nada tinham mais a perder. O Syriza não ganhou porque os gregos são um povo suicida. Venceu porque um povo não gosta de ser espezinhado até ao limite.

Seis anos de políticas feitas a mandato da troika não resolveram nada. Pelo contrário, destruíram o tecido social grego sem construir nada em troca. Na Grécia vive-se uma economia de guerra: quando o Syriza prometeu electricidade gratuita para as pessoas a quem a tinham cortado ou senhas de racionamento para as crianças não fez promessas alucinadas. O medo do desconhecido e uma ruptura total com a UE fizeram com que Samaras vencesse as eleições de 2012. Essa chantagem não resultou: a UE não percebeu o que estava em jogo, hipnotizada pela crença que a Europa é só um Frankenstein fiscal onde tudo o resto é acessório. O futuro da Europa ou é político ou não é. Não pode ser um purgatório fiscal. Ou um muro de lamentações mudas e surdas onde se humilham os povos do Sul em nome da moral. A destruição da classe média, sempre o colchão onde repousa a democracia, criou na Grécia a sensação de que qualquer futuro é menos mau do que esta austeridade que corrói o orgulho nacional. Depois da vitória do Syriza nada será como dantes.» (Realce meu.)

Fernando Sobral

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