10.2.15

Escolher combates



Serge Halimi, em Le Monde Diplomatique (ed. portuguesa) de Fevereiro de 2015:

«Na Grécia e em Espanha, o crescimento de uma esquerda que se opõe às políticas de austeridade encoraja os defensores de uma mudança de rumo da União Europeia. Cada vez mais formal, o debate democrático terá muito a ganhar com isso. Tanto quanto terá a perder com o confronto cultural e religioso, com o "choque das civilizações" que os autores dos atentados de Paris quiseram provocar. (...)

Decididamente, a Europa existe! O então primeiro-ministro grego Antonis Samaras não esperou muito tempo antes de utilizar, com perfeita delicadeza, o assassinato colectivo nas instalações do Charlie Hebdo: «Hoje aconteceu em Paris um massacre. E, aqui, alguns encorajam ainda mais imigração ilegal e prometem a naturalização!»

Um dia mais tarde, em Atenas, Nikos Filis, director do I Avgi, diário de que o Syriza, coligação da esquerda radical, é o principal accionista, retira perante nós uma lição muito diferente do crime cometido por dois cidadãos franceses: «O atentado pode vir a orientar o futuro europeu. Seja no sentido de Le Pen e da extrema-direita, seja no de uma abordagem mais sensata do problema. Porque a procura de segurança não pode ser resolvida apenas pela polícia». No plano eleitoral, este tipo de análise traz tão poucos resultados na Grécia como nos outros Estados europeus. Vassilis Moulopoulos sabe-o. No entanto, este conselheiro de comunicação de Alexis Tsipras não se preocupa: «Se o Syriza tivesse sido menos intransigente na questão da imigração, já teríamos obtido 50% dos votos. Mas esta escolha é um dos poucos pontos em que estamos todos de acordo!»…

Há anos que as políticas económicas praticadas no Velho Continente fracassam, e na Grécia e em Espanha ainda mais lamentavelmente do que noutros países. Mas, enquanto noutros países da União Europeia os partidos de governo parecem resignar-se ao crescimento da extrema-direita, e até contar que ela assegurará a sua manutenção no poder por permitir uma união contra a mesma, o Syriza e o Podemos abriram uma outra perspectiva. Na Europa, ninguém à esquerda cresceu tão depressa como eles. Inexistentes, ou quase, no início da crise financeira há cinco anos, conseguiram desde então realizar dois feitos. Por um lado, surgiram como candidatos credíveis ao exercício do poder. Por outro, talvez estejam prestes a relegar os partidos socialistas dos seus países, co-responsáveis pela catástrofe generalizada, para o papel de forças secundárias.» 
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