4.2.15

Freud e o FMI



«Ler os relatórios do FMI é tão empolgante como ler um romance de Corin Tellado. Já se sabe o que lá está dentro ainda antes de ser divulgado.

A diferença é que nos romances de Corin Tellado o amor vencia e o final era sempre feliz. Nos relatórios do FMI o final é quase sempre infeliz e não há uma pinga de amor nas suas desérticas páginas. Tudo é frieza, como se os homens e mulheres do FMI não tivessem emoções. E fossem apenas frutos tardios de Frankenstein.

Ler o primeiro relatório do FMI de avaliação pós-programa, assinado por Subir Lall, é consumir um formulário que as equipas da organização reproduzem em cada país por onde passeiam. Uma fotocópia: é preciso reformar mais as tabelas salariais, eliminar suplementos remuneratórios, adiar devolução dos cortes de salários e pensões e fazer mais rescisões. O aumento do salário mínimo revela-se para o FMI um glutão da competitividade e a meta do défice está em perigo por causa disso. O FMI tem uma obsessão tão grande com o valor do trabalho que parece defender que deveria ser gratuito.

A parte mais venenosa vem maquilhada de "análise económica" e parece conversa de Estaline: a "instabilidade eleitoral" pode ter consequências graves para as "reformas". (...)

Para que serve um relatório do FMI? Para servir de guião a uma série de humor ou a um partido anti-democracia? Ou, mais sensatamente, quantos FMI existem? Dois? Um Hyde e um Jekyll? Um Jack, o Estripador e outro Mary Poppins? Este relatório do FMI coloca-o a necessitar de frequentar o divã do doutor Freud. Porque nada disto é normal…»

Fernando Sobral

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