29.4.15

Esta União Europeia que nos envergonha



«“Demasiado pouco, demasiado tarde.” É cada vez mais frequente termos de dizer isto da acção de um Estado, da acção dos governantes.

Pelo menos sempre que se trata de promover a paz e o desenvolvimento; de promover a cooperação internacional; de combater a fome, a pobreza e a desigualdade; de investir na educação, na cultura e na ciência; de proteger o ambiente; de garantir a defesa da liberdade, da democracia e dos direitos humanos. E é cada vez mais frequente, tristemente frequente, sermos obrigados a dizer isto da acção da União Europeia, dessa União Europeia que nos seduziu com sonhos de solidariedade e que gosta de se proclamar campeã dos direitos humanos mas que nos envergonha todos os dias com a sua demissão dos mais elementares deveres perante os mais fracos, com a sua cupidez em favor dos mais ricos, com a sua pusilanimidade perante os mais fortes.

A reunião de quinta-feira passada do Conselho Europeu, onde em teoria os 28 Estados-membros da União Europeia tomaram medidas para evitar a catástrofe humanitária dos refugiados que atravessam o Mediterrâneo para tentar chegar à Europa, é apenas mais um de uma longa lista de lamentáveis exemplos de demissão. (...)

Onde estão os políticos europeus que defendem algo de que nos possamos orgulhar? Desapareceram. Mesmo quando parecem existir num dado momento, desintegram-se ao chegar ao primeiro Conselho Europeu. A União Europeia dissolve toda a ideia política e apenas deixa negócios com um cheiro de enxofre no ar.

Onde estão os políticos europeus que defendem essa ideia de uma Europa da solidariedade, dos direitos e do progresso e que têm a coragem de a traduzir em medidas políticas? (...) Estarão todos mortos? Estarão todos nos partidos emergentes que ainda não chegaram ao poder? Ou estará a vontade política a concentrar-se apenas nos partidos xenófobos da extrema-direita? Será o condomínio fechado com os pobres a tentar escalar o muro o único sonho possível nesta Europa de banqueiros-piratas e de políticos-mordomos? (...)

A UE, se tivesse um mínimo de decência ou de vergonha, deveria reconhecer a importância de realizar as necessárias operações de salvamento no Mediterrâneo e não apenas ao longo das suas costas. Deveria discutir seriamente (em casa e com os seus vizinhos de África e do Médio Oriente) uma política de imigração que não deveria ser outra coisa senão generosa e pôr em prática as ferramentas necessárias para fornecer os devidos vistos a refugiados políticos e económicos. E deveria construir uma verdadeira política externa que apoiasse os esforços em prol da pacificação dos países em guerra e do desenvolvimento dos países mais pobres. Devia. Seria uma política externa de que nos poderíamos orgulhar, justa, exaltante e mobilizadora. Mas esta é uma UE da qual não se pode sequer esperar decência.»

José Vítor Malheiros

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