20.7.15

A unidade dos contabilistas



«A União Europeia parece poder deixar o ar condicionado de Bruxelas e transferir-se para a areia de algumas ilhas gregas para gozar a sensação de dever cumprido.

A Grécia, para já, não sai do euro e está transformada num protectorado até nova crise. Em Portugal e Espanha respira-se fundo: pensa-se nas eleições e na forma de os governos reconquistarem os eleitorados perdidos por via da austeridade e de uma visão ideológica da sociedade que está a destruir todos os equilíbrios reinantes e os contratos sociais existentes. (...)

Sobre isto não se falará nas eleições portuguesas, focadas na "estabilidade" e na "maioria". Nem se colocará a possibilidade da futura saída da Grécia do euro alterar a ordem financeira mundial, onde a moeda europeia é hoje crucial. O que esta crise mostrou é que o pretenso "ideal" europeu faliu por detrás de regras económicas e financeiras. Os países deixaram de confiar uns nos outros e as nações começam outra vez a comportar-se como tribos. A divisão norte/sul é cada vez mais visível, mesmo que a França tente recuperar o seu lugar central no eixo, coisa que o seu músculo económico e político já não permite. (...)

A democracia tem estado a ser posta em causa porque são tecnocratas que impõem a maioria das decisões aos políticos eleitos. E os demagogos, à esquerda e à direita, não deixam de surgir no meio de toda esta confusão. O problema nuclear é que se metade da Europa culpa o Governo do Syriza pelo desastre, o certo é que a questão radica na ausência de ideais europeus e unidade política. Bruxelas só pergunta aos Estados pelos resultados financeiros e não quer saber como esses valores são conseguidos em cada país. Haja desemprego, confisco fiscal ou destruição de relações de comunidade. Não há unidade na Europa só porque os contabilistas dizem que existe. O que se está a fazer é a destruição do ideal que o Erasmus simbolizava. A vitória das fiscalidade sobre as ideias. É isso que na realidade definirá o futuro de todos nós. Até dos portugueses. E não a questão da "maioria" e da "estabilidade".»

0 comments: