30.1.16

Uma Bélgica desconhecida e lindíssima



Informação e mais fotografias aqui
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Anita e o défice


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Dica (212)



Para onde vai o PS? (São José Almeida) 

«Por mais que a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa possa até não preocupar António Costa enquanto primeiro-ministro, na sua qualidade de secretário-geral do PS ele tem de estar preocupadíssimo com o que se passou nestas eleições, bem como com a forma como o PS se arrasta na política portuguesa, em estado de ferida aberta e exposta, profundamente debilitado na sua condição de fazer política. O que é facto é que a direcção do PS, e em particular António Costa, ainda não teve capacidade de dar resposta à crise que o partido vive. Pior: parece ignorá-la, tal o inebriamento de ser chefe de Governo.»
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Uma galinha voava, voava...



«Há alguns anos dizia-se, com cinismo, que o Brasil crescia da mesma forma que uma galinha voava: um salto, uma queda, outro salto, outra queda, e voltava sempre tudo ao princípio. Portugal parece-se muito com o Brasil. 

As crises tornam-se momentos de euforia e estes em crises mais ou menos profundas. As últimas centenas de anos mostram como esta galinha tem voado e caído. Sem nada de fundamental mudar. Estamos defronte de um novo ciclo político, com a chegada ao poder de António Costa e a vitória de Marcelo Rebelo de Sousa. Mas isso não implica uma nova realidade económica e financeira, como o Banif já veio provar. (…) Mesmo depois dos erros que o Tribunal de Contas Europeu vislumbrou, a CE continua a fazer de polícia mau contra todos aqueles que não são pesos pesados europeus. Nada de novo. (…)

Vive-se um tempo em que começa a ser muito difícil conciliar as necessidades da maioria da população e aquilo que exige a "realpolitik" definida por entidades não eleitas. E é isso que tem vindo a fazer com que a esquerda tradicional tenha vindo a perder a sua base social de apoio em favor de partidos mais extremistas (muitos deles de direita). Na Europa mais rica junta-se a isso a chegada dos refugiados, mais lenha para a fogueira onde o radicalismo pode dançar à volta.

A globalização e os fluxos de capital que permitiu criaram uma nova sociedade onde o fosso entre os mais ricos e os mais pobres se alargou, com a destruição da classe média e com o evidente perigo que começa a pairar sobre os consensos, definidos pela democracia política. O relatório do Tribunal de Contas Europeu alertava para isso: as severas políticas de austeridade deram força às forças extremistas e xenófobas. Mas, pelos vistos, essa continua a ser a política seguida como fé em Bruxelas e nas instituições internacionais. Tudo em nome da dívida e dos défices. A transformação ideológica é visível: os recursos públicos têm como prioridade a devolução da dívida e dos juros, de modo que os Estados possam continuar a financiar-se. Pouco importa a sustentação da coesão social. E é a isso que assistimos, mais uma vez, por estes dias em que as galinhas não podem voar.»

29.1.16

Jacques Rivette – Mais um, menos um




Jacques Rivette, um dos últimos realizadores da Nouvelle Vague, morreu hoje com 87 anos. Ciclos históricos que se fecham.




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Ler quem sabe pensar


«A julgar pelo que se vai lendo nos jornais e vendo nas televisões a propósito do esboço de OE2016, Portugal está à beira de uma situação dramática: ou o governo "bate o pé" a Bruxelas (tornando-se num caso tipo Syriza do início de 2015); ou cede às pressões de Bruxelas e o governo cai por divergências à esquerda (tipo Syriza pós-Verão de 2015). É uma hipótese. A outra é que a comunicação social se tenha habituado a viver num registo de dramatização permanente e que a resolução da situação seja menos extremada do que parece.

A mim, a troca de mensagens entre o governo e a Comissão Europeia soa a coreografia previamente ensaiada. Não imagino que o governo socialista tenha avançado com este esboço de OE sem saber à partida como iria reagir a Comissão. Também não estou a ver o PS a preparar-se para um confronto com Bruxelas, nem a deitar por terra a solução de governo alcançada há dois meses. A ser assim, vejo dois desfechos possíveis (e não mutuamente exclusivos) para este aparente impasse: ou está em preparação um acordo político de nível europeu, que acautela não apenas a situação portuguesa mas a de outros países em condições semelhantes; ou o governo revê o OE2016, reduzindo o défice estrutural previsto através de medidas que não contradizem os acordos à esquerda.

Não precisaremos de esperar muito para tirar isto a limpo. Até lá, não vale a pena aderirmos acriticamente ao estado de excitação reinante.»

Ricardo Paes Mamede no Facebook
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Dica (211)



Que um sangue impuro. (Fernanda Câncio)

«Quando na grandiosa manifestação que em 11 de janeiro de 2015 homenageou os mortos Charlie se cantou A Marselhesa, Cohn-Bendit comentou com estupor o uso da estrofe "que um sangue impuro ensope os nossos campos": "É de quem não percebeu nada." Um ano depois, é a estrofe maldita e xenófoba que nos ri na cara. É ela, da França à Dinamarca que expropria refugiados e a Gales que os marca com pulseiras fluo, o novo rosto dos "valores europeus". Bastou um ano de medo para fazer párias dos nossos bons princípios; quatro meses para que já não queiramos saber o que sucede aos Aylan Kurdi; 71 anos para perdermos a vergonha. Puro ou impuro, o que nos corre nas veias é nada.»
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Ó IVA, ó IVA, Portugal à vista



Morangos com vinho do Porto paga IVA de (13*m1+23*m2)/(m1+m2) em que m1 é a massa de morangos e m2 a de vinho.
(Lido algures no Facebook)

E nunca mais pedir sumo de laranja, mas sim uma laranja e um copo vazio – os restaurantes passarão a fornecer espremedores. E varinhas mágicas para batidos.
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Papa Marcelo II



«Tal como previsto, Marcelo Rebelo de Sousa vai ocupar o lugar, ainda, ocupado por Aníbal Cavaco Silva. Mal soube o resultado, Maria Cavaco foi esconder as terrinas de prata: "Ele nem tem primeira-dama. Isto fica para mim."

Na noite das eleições, quem ligasse a TV diria que nada mudou. Marcelo estava na televisão ao domingo, à noite, a fazer a sua homilia. O futuro PR podia ter feito o discurso de vitória na Casa de Bragança, fazia mais sentido do que na Universidade de Direito. Pior, só na Prevenção Rodoviária Portuguesa...

Ainda mal tinha aquecido o futuro lugar e já Marcelo estava a ver o seu estado de graça beliscado pela sua genica. O ex-comentador da TVI foi criticado por ter estacionado num lugar reservado a pessoas com mobilidade reduzida e por não ter usado o cinto de segurança. É fácil concluir que dos 150 mil euros gastos por Marcelo na campanha, 120 mil foram em multas de estacionamento. Vamos ter um PR que vai reunir com a EMEL todas as sextas.

Parece-me uma polémica exagerada, provavelmente Marcelo, com a pressa, pensou que aquilo, desenhado no sinal, era um trono. Mas damos graças a um deus qualquer por esta micropolémica só ter surgido a seguir às eleições, ou teríamos Cândido Ferreira a pôr em causa a validade da carta de condução de Marcelo. (...)

Penso que a relação entre Marcelo e Costa vai ser óptima até Passos Coelho desaparecer. Quando vier o novo PSD, se as sondagens valerem o risco, a amizade começa a azedar. Se nada acontecer, são dez anos disto. Em princípio, aguento. Depois do Aníbal, tenho uma couraça.»

João Quadros

28.1.16

Tapa-se a vergonha e confisca-se a dignidade



António José Teixeira, no Expresso diário de 28.01.2016.
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Pete Seeger, com um dia de atraso



Fez ontem dois anos que Pete Seeger se calou para sempre, com 94 anos. Mas é como se ainda andasse por aí, tal foi a marca que deixou em várias gerações dos cinco continentes. Transpirava força e optimismo, ajudou muitos a lutar para que que este mundo venha a ser melhor um dia.

Sobre a sua vida: La vida en un puñado de versos.

E alguns vídeos, entre dezenas possíveis:








Aos 74:



Adeus, Pete:
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Assim também eu



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:

«Marcelo Rebelo de Sousa foi eleito há quatro dias e já é o melhor Presidente da República dos últimos 10 anos. (…)
Um [Cavaco] faltou ao funeral do prémio Nobel; o outro [MRS] recomenda livros de pessoas que nem os jogos florais das Caldas da Rainha ganharam.» Etc., etc., etc.

Na íntegra AQUI.
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Ficheiros secretos



«As teorias da conspiração à volta da presença da troika em Portugal poderiam alimentar um episódio de "Ficheiros Secretos". Não que Mulder e Dana Scully se pareçam com os técnicos do FMI e da União Europeia que cirandaram pelos corredores do poder em Lisboa. Mas sim porque os dois agentes do FBI poderiam encarar os "homens de negro" como extraterrestres que aterraram num mundo que não conheciam, nem queriam conhecer, e impuseram aí as suas leis. (…) O relatório do Tribunal de Contas Europeu (TCE) é um ficheiro secreto muito claro. Faz luz sobre o laboratório em que foi transformado Portugal em nome da dívida e do défice. E que serviu para tentar criar um novo modelo económico e social em Portugal. Que destruiu parte do sector produtivo existente e empobreceu a população. Onde, em contrapartida, não eliminou as cumplicidades de negócios a nível do Estado. Nem mudou as lógicas de ligações políticas e económicas que alimentam a nossa corrupção. (…)

Os "ficheiros secretos" foram assim utilizados, sem qualquer pinga de emoção ou de análise do que realmente se passava em Portugal, para impor soluções que contribuíram para os disparates que se fizeram. Mulder e Scully tinham aqui bons motivos para encontrar uma conspiração perfeita para arrastar países periféricos para a ruína, destruindo alguns dos seus sectores económicos estratégicos. Dava para fazer um episódio de "X-Files".»

Fernando Sobral

27.1.16

Grécia: «Schengen e a Europa estão em perigo»

Será que temos consciência daquilo que está a ser preparado na Europa?




«Ao caminhar pela rua, "alguns condutores veem as nossas pulseiras, começam a buzinar e gritam pela janela: 'voltem para o vosso país'. Há pessoas que nos dizem coisas terríveis", relatou Ngalle. (…)

Esta semana surgiu também, no Reino Unido, a polémica à volta da cor vermelha com que se pintaram as portas das casas onde vivem requerentes de asilo em Middlesbrough, no nordeste de Inglaterra, uma medida que conduziu a diversos ataques racistas.»
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Mahalia Jackson, «The Queen of Gospel»



A grande Mahalia Jackson, «The Queen of Gospel», morreu há 44 anos, em 27 de Janeiro de 1972. Calou-se então uma das vozes mais extraordinárias do século XX e que associaremos também, para sempre, às lutas contra a segregação racial nos Estados Unidos.








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Dica (210)




«Roma ainda não é o Estado Islâmico, não dinamita, só esconde. E não foi por extremismo religioso, mas só por miserabilismo moral. Uma pequena caixa para a Vénus Capitolina, um grande salto à retaguarda para a Humanidade. Ora, nisto de recuar, o problema é o gosto que se entranha. Matteo Renzi, desde ontem o pobre diabo que governa a Itália, levou Roahni para uma sala onde havia a estátua equestre de Marco Aurélio. Olhem o terror nos olhos de Renzi: e pila de cavalo à mostra, ofende?» 
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Rescaldos e mais rescaldos


«Marcelo (…) não ganhou por causa da TV. Ganhou porque foi uma figura política forte ao longo de muito tempo (desde o Expresso nos anos setenta até à criação do PSD, a que depois presidiu), ganhou porque não teve opositor forte no PS e ganhou porque fez a campanha ao centro, apoiando o governo de Costa. Se não fosse uma figura incrustada no passado do PSD, não era candidato viável. Se tivesse um(a) opositor(a) mais forte na área do PS, outro galo cantaria. Se tivesse feito a campanha à direita, tinha segunda volta (…)

Finalmente, as maiores TVs escolheram discriminatoriamente entre as candidaturas e o resultado desmentiu flagrantemente a sua escolha. Para a TVI e para a SIC, em termos de debates em canal aberto só contavam Marcelo, Nóvoa e Belém, tendo outros candidatos sido relegados para o cabo (Edgar e Marisa, com uma diferença na audiência de um para dez ou para vinte em relação aos debates em canal aberto) e os outros reduzidos a semi-debates em canal cabo. Essa escolha foi uma decisão política. E não só foi errada como foi desmentida pelos resultados, quando Marisa provou que representava duas vezes e meia a expressão de Maria de Belém.»

Acredita nos glutões?



«O anúncio de que poderia haver um crédito fiscal de 35%, feito antes das eleições pelo Executivo de Pedro Passos Coelho, eclipsou-se e transformou-se em zero. A tabuada política nem sempre sobrevive à matemática real. O toque de Midas de Maria Luís era, afinal, uma forma de transformar o ouro em chumbo. Escava-se o buraco e continua a surgir esse "zombie" que ressuscita todos os anos, chamado BPN.

O Estado, pelos vistos, lá tem de despejar mais 526 milhões de euros nesse glutão que alimentou tantas boas famílias em Portugal e que agora continua a assombrar os contribuintes distraídos. Tal como o Banif. Tal como o Novo Banco. O dinheiro escorre e evapora-se enquanto aumenta a dívida e os portugueses são chamados, patrioticamente, a tapar os buracos. Acredita nos glutões?, perguntava uma velha campanha de publicidade. Olhando para o que se passa por este sítio não é difícil dizer que sim.

Os glutões são o símbolo da nossa sociedade amena e temperada, do nosso país de brandos costumes. Onde a socialização dos prejuízos se tornou, há muito, um dogma. Uma verdadeira fé "zombie", cujos maiores crentes continuam a venerar porque sabem que nada, nem ninguém, colocará ordem no galinheiro. Afinal, contados os votos presidenciais, sobram agora as contas. Como nos EUA, é preciso, em Portugal, dinheiro para se ser candidato a Presidente. Ou ter partidos que paguem as contas. Quem não teve 5% de votos, para ter direito à subvenção pública, bem pode dizer que todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros. Quem gastou pouco não se queixa. Mas a conta de Maria de Belém é maior do que os gastos da campanha: levou à insolvência uma forma de fazer política em Portugal. Ainda acredita nos glutões?»

Fernando Sobral


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26.1.16

Da vergonha alheia




Lê-se e é difícil acreditar. Num dos países mais ricos da Europa, aquele em que os cidadãos de dizem felicíssimos, acontece isto. É mesmo caso para se dizer que há algo de podre no reino da Dinamarca.

«O parlamento dinamarquês aprovou esta terça-feira, por larga maioria, a polémica reforma da lei do asilo, que prevê, entre outras medidas, o confisco de valores aos refugiados. As alterações que hoje passaram vão peitir à polícia revistar os que entram no país e confiscar bens com valor superior a 10 mil coroas dinamarquesas (1340 euros), desde que não sejam considerados essenciais ou de valor sentimental, como alianças.» 
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Nuno Teotónio Pereira e Edmundo Pedro numa fascinante conversa (2)



Como tinha anunciado, retomo o relato de uma conversa que tive, em 27 de Maio de 2008, com Edmundo Pedro (EP) e com Nuno Teotónio Pereira (NTP) e que já foi objecto de um primeiro texto publicado neste blogue, por ocasião da morte de NTP. Falaram então sobretudo do início da guerra Civil de Espanha, em Julho de 1936.

No dia 18 de Outubro desse mesmo ano, EP partiu para o Tarrafal, onde ficou até Agosto de 1945. Foi de lá que acompanhou a Segunda Guerra Mundial.
Em Lisboa, NTP começou uma longa evolução pessoal: ao lado do pai, profundamente anglófilo, tomou sempre partido pelos Aliados. «Quando a guerra acabou, era já um democrata», comenta. Para tal mudança terá contribuído, também, a influência da doutrina social da Igreja. Mas quer deixar bem claro que repudiava todas as formas de totalitarismo, «tudo o que fosse fascismo ou que "cheirasse" a comunismo» - em nome das suas convicções religiosas e, também, porque lia os relatos dos crimes do estalinismo. «Em que nós não acreditávamos», comenta EP que era então militante do PCP.

Fala-se depois da campanha de Humberto Delgado, em 1958
Esse ano foi decisivo para uma viragem definitiva na vida e nas convicções de NTP. Por causa da campanha presidencial, certamente, mas muito mais pela influência directa de Francisco Lino Neto. Um documento que este escreveu, em Junho de 1958, foi importantíssimo para NTP e foi um marco incontornável na história da oposição dos católicos (1). Recorde-se que a célebre carta do bispo do Porto a Salazar, datada de 13 de Julho de 1958, é erradamente considerada como o primeiro passo da referida oposição, quando, de facto, foi já uma consequência da iniciativa de Lino Neto. A um outro nível, a vida de NTP foi também fortemente influenciada por Natália, sua mulher: com formação e antecedentes políticos radicalmente diferentes, a presença de Natália - que nem sequer era católica - viria a ser decisiva.
Entretanto, EP, juntamente com Piteira Santos, Varela Gomes e outros, tentou preparar uma insurreição armada que tirasse partido das condições excepcionais criadas pela campanha de Delgado. Mas falharam todas as hipóteses para conjugar esforços e reunir um mínimo de condições indispensáveis.

Volta-se um pouco atrás, a 1956 e à importância da invasão da Hungria pelas tropas soviéticas, especialmente traumatizante para EP:
«Foi o ano das minhas primeiras dúvidas. Um choque brutal, demolidor. Mas a crença no projecto soviético era tão firme que não abanava à primeira. Comecei no entanto a reflectir, sobretudo pelo facto de os operários das fábricas dos arredores de Budapeste resistirem contra o que era suposto ser o seu próprio governo!»

Dá-se depois um salto: doze anos mais tarde, 1968 e a invasão da Checoslováquia. Aqui, vou deixá-los falar, transcrevendo quase ipsis verbis o que disseram.
NTP - «Então e em relação à Primavera de Praga?»
EP - «Isso aí foi quando percebi tudo, claramente. E rompi completamente [com o PCP].»
NTP - «O que se passou com a Primavera de Praga foi terrível. Se tivesse conseguido vencer, tinha provocado grandes transformações no mundo. Tinha-se propagado a outros países e tinha inaugurado uma época fantástica. Assim, o capitalismo fortaleceu-se e o socialismo afundou-se.»
EP - «Tenho muitas dúvidas, porque a União Soviética estava no auge da sua força, tão grande que era capaz de abalar tudo. E aquela intervenção era indispensável para a consolidação do império soviético.»
E, em jeito de conclusão:
«Acompanhei aquilo tudo com uma paixão enorme, com uma grande ilusão. Uma revolução democrática com rosto humano, como a que, uns anos antes, tinha sido anunciada por Fidel de Castro em Cuba.»

De Cuba, da década de 60 em geral e de tudo o que se seguiu, falarei - falarão eles - dentro de alguns dias. Porque a conversa foi longa e ainda faltam umas tantas histórias.

(1) «Considerações dum católico sobre o período eleitoral», Junho de 1958. Documento publicado em José da Felicidade Alves (edição e coordenação), Católicos e Política. De Humberto Delgado a Marcelo Caetano, (s.d.), 288 p., pp. 17-30. 
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Quem pensa assim não é gaga


«À Esquerda não há crise, há recomposição. O espaço vazio que o PS escancarou com as suas indefinições foi ocupado por uma Esquerda de ideias no lugar e mensagens claras. Sampaio da Nóvoa fez uma boa e importante campanha, mas foi incapaz de se libertar de contingências que não eram suas: o confronto com Maria de Belém e a constante definição "de Centro", a identidade natural de quem, como Marcelo, abdicou da política para não arriscar ambiguidades.

Quanto ao futuro, três certezas. A imprevisibilidade de Marcelo, a esperança aberta por uma Esquerda que cresce, e a alegria por nos vermos livres de Cavaco. Ao vetar os diplomas da adopção por casais do mesmo sexo e da reposição do aborto sem humilhações, Cavaco Silva só não apodreceu ainda mais a sua imagem porque já não havia muito por onde piorar.»  

Mariana Mortágua

O adeus de Passos Coelho



«Em Itália, Beppe Grillo, o cómico transformado em político, saiu de cena. Em Portugal, o homem conhecido por abraçar Guterres e ir a "reality shows", Tino de Rans, ou mais prosaicamente Vitorino Silva, promete ficar por aqui. "Não vou parar por aqui", prometeu. (…)

Candidatos como Tino de Rans são demasiado frágeis para amolgar a hegemonia dos partidos, mas são um sinal de que um dia algo pode surgir, ou seja, uma tempestade tropical provocada pelo aquecimento global dos partidos e pelo efeito do calor no discernimento dos líderes. Mas, até lá, a vitória de Marcelo tem outros efeitos. Sossega, pelo menos para já, António Costa na direcção do Governo, gerindo entre as múltiplas sensibilidades e interesses que se cruzam no Parlamento e nas sedes sindicais.

A vitória de Marcelo é sobretudo o toque de finados para Pedro Passos Coelho: a sua reforma antecipada é agora inevitável, porque o mundo onde foi fermentado secou. Marcelo, apoiado por Passos depois de este ter engolido um sapo, é pelo consenso e não pela política das pedradas. O teatro de comédia para este terminou ao intervalo. E já não volta, nem como "compère". Como se provou na curta declaração, sem açúcar ou sal, que debitou na noite presidencial. Tino de Rans, pelo menos, sorriu imenso após os resultados. Passos Coelho declarou o seu próprio fim. Como se fosse uma tragédia. E não o é.»

Fernando Sobral

25.1.16

Tout va bien?



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Lá vai o português


@alfredocunha

«Lá vai o português, diz o mundo, quando diz, apontando umas criaturas carregadas de História que formigam à margem da Europa.

Lá vai o português… lá anda. Dobrado ao peso da História, carregando-a de facto, e que remédio – índias, naufrágios, cruzes de padrão (as mais pesadas). Labuta a côdea do sol-a-sol e já nem sabe se sonha ou se recorda. Mal nasce deixa de ser criança: fica logo com oito séculos.

No grande atlas dos humanos talvez figure como um ser mirrado de corpo, mirrado e ressequido, mas que outra forma poderia ele ter depois de tantas gerações a lavrar sal e cascalho? Repare-se que foi remetido pelos mares a uma estreita faixa de litoral (Lusitânia, assim chamada) e que se cravou nela com unhas e dentes, com amor, com desespero, ou lá o que é. Quer isto dizer que está preso à Europa pela ponta, pelo que sobra dela, para não se deixar devolver aos oceanos que descobriu, com muita honra. E nisto não é como o coral que faz pé firme num ondular de cores vivas, mercados e joalharia; é antes como o mexilhão cativo, pobre e obscuro, já sem água, todo crespo, que vive a contra-corrente no anonimato do rochedo. (De modo que quando a tormenta varre a Europa é ele que a suporta e se faz pedra, mais obscuro ainda).

Tem pele de árabe, dizem. Olhos de cartógrafo, travo de especiarias. Em matéria de argúcias será judeu, porém não tenaz: paciente apenas. Nos engenhos da fome, oriental. Há mesmo quem lhe descubra qualquer coisa de grego, que é outra criatura de muitíssima História.

Chega-se a perguntar: está vivo? E claro que está: vivo e humilhado de tanto se devorar por dentro. Observado de perto pode até notar-se que escoa um brilho de humor por sob a casca, um riso cruel, de si para si, que lhe serve de distância para resistir e que herdou dos mais heróicos, com Fernão Mendes à cabeça, seu avô de tempestades. Isto porque, lá de quando em quando, abre muito em segredo a casca empedernida e, então sim, vê-se-lhe uma cicatriz mordaz que é o tal humor. Depois fecha-se outra vez no escuro, no olvidado.

Lá anda, é deixá-lo. Coberto de luto, suporta o sol africano que coze o pão na planície; mais a norte veste-se de palha e vai atrás da cabra pelas fragas nordestinas. Empurra bois para o mar, lavra sargaços; pesca dos restos, cultiva na rocha. Em Lisboa, é trepador de colinas e de calçadas; mouro à esquina, acocorado diante do prato. Em Paris e nos Quintos dos Infernos topa-a-tudo e minador. Mas esteja onde estiver, na hora mais íntima lembrará sempre um cismador deserto, voltado para o mar.

É um pouco assim o nosso irmão português. Somos assim, bem o sabemos.

Assim, como?»

José Cardoso Pires, E Agora, José?, 1977
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Dica (209)



O indispensável plano B. (Alexandre Abreu) 

«Não se trata de deixar de fazer o que está a ser bem feito, como gostaria a direita. Trata-se de preparar antecipadamente como conduzir politicamente um tal choque externo, para que não seja a direita a conduzi-lo.» 
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Uma boa piada é uma boa piada


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Surpresa nas cartas marcadas



«Marcelo ganhou. Era o resultado anunciado mas tremeu até ao último minuto. O candidato de direita fez a campanha ao centro, entronizando-se como o melhor amigo do governo Costa, dado que, para Marcelo, mais vale ser presidente da marmita durante um par de anos do que duque recalcitrante a vida toda. Com tal amor, arriscou a dissidência da direita, mas esta soube engolir o sapo. O recado é este: se a direita quer guerra, ainda vai ter que esperar.

O PS, dando por certo que Marcelo ganharia e medroso da sua divisão interna, escondeu-se numas “primárias” entre Nóvoa e Belém e a coisa descambou em rasteirice. Belém desapareceu. Mas Nóvoa, homem de esquerda, quis fazer-se ao centro com Eanes como tutor, com o dissabor desagradável de se ver comparado a Cavaco. Merecia ter uma segunda volta. O recado é: como na vida os comboios não passam pela paragem do autocarro, o PS perdeu ao fugir.

À esquerda, a certeza é que está a mudar o mapa político. Arrasando as sondagens, Marisa, gigante, demonstrou que há muita gente que não está a ver o filme. Outubro não foi um sinal volátil, foi o início de viragem de uma vontade popular que desconfia dos bonzos do regime e quer desequilibrar a desigualdade. Foi sobretudo a afirmação de uma direcção potente, em que Catarina Martins demonstra mais uma vez que há surpresas até nas cartas marcadas. Ao contrário de Marcelo, Catarina e Marisa parecem suspeitar de novas pressões europeias para mais austeridade. Então, o recado é: o governo, cá dentro, e a Comissão Europeia, fora e dentro, devem perceber que a paisagem se inclinou. Portugal está a mudar.»

Francisco Louçã

24.1.16

Em jeito de rescaldo da noite



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Parabéns, Marisa


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A Espanha no seu labirinto


Enquanto esperamos pelo desfecho do nosso presidencial concurso, talvez possamos gastar algum tempo com nuestros hermanos, lendo este manifesto assinado por 20 intelectuais e políticos espanhóis que exigem que seja formado um governo «progressista» que corresponda às exigências da maioria dos cidadãos, que votou a favor de uma mudança nas eleições de 20 de Dezembro.

NECESITAMOS OTRO GOBIERNO.

Extenuado com tanta reflexão!


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Ainda a reflectir



A ver se o Google o ajuda. 
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Dica (208)



O irreflectido dia de reflexão. (Ferreira Fernandes)

«Significa isto que se um candidato - dos que, na última quinzena, abriram telejornais dizendo banalidades - tivesse revelado, ontem à noite, o segredo da cura do cancro eu não poderia hoje dizer- -vos. Teria de esperar por segunda-feira, data em que se espera que os portugueses voltam a ser legalmente irreflectidos, para vos dar a novidade.»
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