10.12.16

Dica (453)




«In the not too distant future, technology giants will decide what news sources we are allowed to consult, and alternative voices will be silenced. (…)
The filters in the future won’t be programmed to ban pornographic content, or prevent user harassment and abuse. The next era of the infowars is likely to result in the most pervasive filter yet: it’s likely to normalise the weeding out of viewpoints that are in conflict with established interests.»
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Para mais tarde recordar



Público, 10.12.2016
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10.12.1948. Declaração dos Direitos Humanos



… lida por Eleanor Roosevelt.

Daqui.

Por que estamos a andar para trás



«Várias coisas que sempre defendi, prezei e considerei importantes na vida política das democracias europeias estão em profunda crise e não penso que sejam capazes de sair dessa crise tão cedo. É o caso da emancipação da vida política democrática do dilema esquerda-direita, do centrismo e da moderação “central” que partidos do centro-direita e do centro-esquerda traziam às democracias, isolando os extremismos, é a aceitação de que as políticas em democracia são pela sua própria natureza plurais e resultam de uma escolha livre e não da imposição do “não há alternativa”, e que, num certo sentido, os eleitores podem, por tentativa e erro, “experimentar”, sempre com recuo e alternativa. A tudo isto somava-se a luta pela prevalência de uma cultura política civilizacional que distinguia a demagogia da democracia. Tudo isto está em profunda crise e não adianta esperar melhorias, porque o tempo não volta para trás em função dos nossos desejos, embora, num certo plano universal, esteja mesmo a voltar para trás. Para o lado errado do de trás. (…)

Os anos 60 trouxeram um novo alento para as democracias, mesmo escrevendo direito com linhas tortas. Uma geração que chegou à política nesses anos ajudou a uma renovação cultural significativa das democracias envelhecidas e trouxe novos temas e novas “libertações”, em particular nas questões de género e de raça, que iam muito para além da agenda social tradicional dos movimentos sindicais, comunistas e socialistas radicais que existiam na Europa. O radicalismo inicial da geração de 60 ajudou a criar um ponto sem retorno e a entrada desses homens e mulheres no mainstream político fortaleceu as democracias e definiu-lhes novos objectivos. Essa geração não tinha os complexos reverenciais que a esquerda, mesmo a não-comunista, tinha em relação à URSS, integrou na luta pela liberdade os judeus perseguidos e os dissidentes soviéticos e fez parte de alianças sem precedentes como aquela que deu origem ao Solidarnósc, onde o Papa e padres católicos e militantes e intelectuais trotskistas ajudaram a acabar com a Guerra Fria e a derrubar o Muro.

Foi também nesta altura que a dicotomia esquerda-direita começou a perder sentido. Na verdade, foi uma perda de sentido mais instrumental do que afectiva. As “tradições” e o sentido da história pessoal e familiar continuavam muito presos a cem anos de arregimentação, e permanecia igualmente a questão filosófico-política do optimismo e do pessimismo antropológico, que definia uma divisão, mas não era nem é suficiente para lhe definir as fronteiras no quotidiano. (…)

Podia-se dizer que aquilo que em Portugal se chamava “causas fracturantes” não era suficiente para eliminar a demarcação política, até porque ela permanecia na questão social. Mas elas assumiam uma importância considerável porque no mundo ocidental, nas grandes metrópoles, a melhoria das condições materiais associadas a uma nova pluralidade de opções de vida, sociais, escolares, de lazer, familiares, relacionais, as tornavam parte da democracia e da igualdade, por exemplo entre homens e mulheres, e de possibilidade sem exclusão de escolhas no plano sexual, que se revelavam parte da liberdade que cada um exigia para si próprio. Por isso, na vida e nas opções que se incorporaram na política nas democracias estavam cada vez mais questões em que a dicotomia esquerda-direita não tinha sentido. A emergência de partidos como o Partido Libertário nos EUA, ou mesmo em Portugal, o percurso original do PPM, ou a aparição mesmo que débil de uma esquerda liberal e de uma direita emancipada nos “costumes” revelavam essa nova tendência. Os partidos mais conservadores, o PCP, o PSD, o CDS e o PS, e a influência política da Igreja, ainda forte mas em crise, tentaram travar este processo, mas acabaram por se lhe render, uns mais, outros menos.

Mas a chave da questão a que vamos voltar é aquela em que começa o parágrafo anterior: a melhoria das condições materiais de vida. Foi isso que permitiu um aprofundamento e melhoria da democracia e é isso que hoje emperrou e nos faz voltar para trás. É porque o melhorismo que é intrínseco ao objecto das democracias, o bem comum, está em crise, que estamos a voltar para trás. O mundo novo que está a vir é um recuo no modo de pensar, nas palavras e infelizmente nas acções. Lá vou eu ter que voltar a falar de esquerda e de direita, o que bem atravessado me está. Mas se o mundo se tornou cavernícola, não posso agora pedir-lhe que pare às cinco horas para tomar chá.»

9.12.16

Dica (452)

2016 - Fim de uma estrutura de ordem


Para ler e meditar.

«Na hierarquia dos anos históricos, 2016 deverá ser o marco que sinaliza o fim da estrutura de ordem configurada e dominada por potências ocidentais, consumando o fim dos impérios europeus com o que aparece agora como estando a ser o fim do império americano.

O traço mais relevante deste ano histórico é que este é um processo que se apresenta como um efeito de imunodeficiência, que estimula a manifestação súbita de formas patológicas e destrutivas numa estrutura que, até agora, parecia estável e coerente. As potências ocidentais não foram derrotadas por poderes superiores, elas foram fragmentadas e desagregadas porque os seus sistemas políticos deixaram enfraquecer aquele que é o seu principal dispositivo de defesa contra as mutações patológicas e os vírus agressivos: os procedimentos eleitorais.»

Continuar a ler AQUI.
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Novas esperanças, grande renovação à vista



Público, 09.12.2016
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Frase do dia


«O verdadeiro e efectivo pai do SNS é, aliás, Baltasar Rebelo de Sousa, como o presidente da república notou na biografia do pai.» - Rui Ramos no Observador.

N.B.- «república» com minúscula, eu fiz copy/paste
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Entrevista com o Diabo



Entrevistador: Olá, Diabo. Para começar, queríamos agradecer a sua disponibilidade para esta entrevista. (…)
Diabo: Eu é que agradeço a oportunidade que me dão de, finalmente, poder vir a público defender a minha honra. Uma coisa é dizer que eu personifico o Mal, outra é andar a fazer crer que eu nunca chego a horas. (…)

E: Portanto, acha que a sua honra foi posta em causa quando...
D: ... quando o vosso ex-PM disse que eu chegava em Setembro! Fiquei chocado. Até telefonei ao Doutor Marques Mendes, que é o meu advogado. Atenção, isto não é pessoal. Eu até aprecio algumas decisões que ele tomou enquanto PM. Era o tipo de coisas que eu faria. Até posso revelar que aquela ideia de ir além da troika deu origem a um Parque de Horrores no Inferno. Mas dizer que eu vou aparecer em Setembro, quando não combinámos nada, acho de profundo mau gosto.

E: Quer dizer que nunca pensou aparecer em Portugal em Setembro?
D: Nunca. Eu, em Setembro, estive o mês todo na Síria, tirando o último fim-de-semana, em que fui a uma reunião em Nova Iorque no Goldman Sachs. Em momento algum pensei aparecer em Portugal em Setembro. Nem faço planos para lá ir tão cedo. Eu não sou como Deus. Não sou omnipresente. Tenho um limite de milhas por ano. (…)

E: Quer dizer que os portugueses podem estar seguros de que o Diabo, tão cedo, não vai aparecer em Portugal?
D: Vocês já viram como está o mundo? Tenho o Brexit, a Le Pen nas eleições francesas, o Trump, nunca tive tanto trabalho. É a globalização. Para aí desde mil novecentos e trinta e tal que não tínhamos tantas encomendas.

E: Portanto, não adianta o nosso ex-PM insistir?
D: Acho muito complicado. Eu, em 2017, vou andar em "tournée" e única data disponível que tenho é o 13 de Maio, e o que me disseram é que nessa altura nem pensar porque têm os hotéis todos cheios por causa da visita do Papa. Eu não fico ofendido mas, no fundo, isto é não saber o que querem.»

8.12.16

Dica (451)



France Returns to Its Conservative Roots. (Ullrich Fichtner e Simone Salden) 

«François Fillon has emerged as the center-right candidate for the French presidency. His choice is symptomatic of a country that has never left its conservative, Catholic roots behind.» 
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PISA. E nós tão contentes





«Pisa results are anxiously awaited by governments, education ministers, and the editorial boards of newspapers, and are cited authoritatively in countless policy reports. They have begun to deeply influence educational practices in many countries. As a result of Pisa, countries are overhauling their education systems in the hopes of improving their rankings. Lack of progress on Pisa has led to declarations of crisis and "Pisa shock" in many countries, followed by calls for resignations, and far-reaching reforms according to Pisa precepts. (…)

The new Pisa regime, with its continuous cycle of global testing, harms our children and impoverishes our classrooms, as it inevitably involves more and longer batteries of multiple-choice testing, more scripted "vendor"-made lessons, and less autonomy for teachers. In this way Pisa has further increased the already high stress level in schools, which endangers the wellbeing of students and teachers.»
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Alô, PSD? Já ganhei o dia

A Europa começa a provocar repulsa



«Los dirigentes europeos parecen empeñados en que no pase un día sin que las personas corrientes tengamos que sentir algo más que vergüenza de lo que hacen en materia económica. (…)

Se dijo por activa y pasiva que los recortes sociales y las ayudas multimillonarias a la banca eran la condición necesaria para recobrar la actividad y el empleo, para reducir la deuda y para asegurar definitivamente el sistema financiero. Pero lo cierto es que desde que empezaron a aplicarse en la Unión Europea al estallar la crisis hay unos siete millones menos de empleos a tiempo completo, seis millones más de parados, otros casi seis millones más de empleos no voluntarios a tiempo parcial (en la UE28), cinco millones más de personas en riesgo de pobreza y 35 puntos más sobre el PIB de deuda pública (en la Eurozona). Y los bancos se siguen encontrando en insolvencia y muchos de ellos a punto de estallar de nuevo en cualquier momento. (…)

El criterio del 3% es una arbitrariedad, una farsa, pero, además, algo completamente inútil para lo que aseguraban que iba a servir, es decir, para reducir la deuda: cuando comenzó a utilizarse como criterio de cumplimiento obligatorio para todos los países la deuda era aproximadamente de un 55% del PIB, como media de los países europeos, y ahora, como he señalado, supera el 90%.

La prueba de que se trata de una cifra completamente arbitraria, que no se establece así porque sea mejor o peor para la economía o para reducir la deuda, sino como recurso de los dirigentes europeos para disciplinar y someter a los gobiernos y para anular su capacidad de maniobra, es que se puede incluir o dejar de incluir dentro de ese porcentaje lo que le venga en gana a quien lo impone. (…)

Decía hace unos días el presidente del Banco Central Europeo, Mario Draghi, que la integración europea se había debilitado en los últimos tiempos por los populismos. Una opinión que demuestra que las autoridades europeas han perdido completamente el norte y que no entienden el sentido de las cosas que están pasando y de las que se encuentran ya a la vuelta de la esquina en Europa. Eso que llaman los populismos no es lo que debilita la integración europea sino la consecuencia de haber querido integrar a Europa a base de mentiras y de políticas que constantemente han dado como resultado lo contrario de lo que se decía que traerían consigo.

Cuando se ha hecho sufrir a millones de personas y cuando han muerto miles a causa de los recortes, cuando se han deteriorado los servicios públicos y no se han atendido las necesidades básicas de la población porque, según se decía, había que cumplir a rajatabla la norma del déficit, y de pronto se dice que no hay límite para comprar armamento, carros de combate o minas, ¿tienen también culpa los populismos del asco o de los negros fantasmas que comienzan de nuevo a recorrer Europa?»

7.12.16

Figuras do ano



1938 – Adolf Hitler

2016 – Donald Trump 
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A Arménia, antes e depois de um 7 de Dezembro



Em 7 de Dezembro de 1988, às 11:41, a terra tremeu na Arménia, causando dezenas de milhares de mortos e centenas de milhares de sem abrigo.

Estive em Gyumri, segunda cidade do país, onde a temperatura chega a atingir 45º negativos, e que foi a região mais atingida. A data é um ponto de referência permanente, quer na descrição dos edifícios entretanto restaurados, quer naqueles que ainda não o foram. Há um antes e um depois daquele terrível 7 de Dezembro.



Charles Aznavour é um ícone nacional para os arménios, não só pelo seu êxito como cantor, mas também e talvez sobretudo, pela sua acção após este terrível sismo. Percorreu o país pouco depois, criou uma Fundação específica para o efeito, que reuniu mais de 150 milhões de dólares, e o governo doou-lhe uma casa, em Yerevan, onde funciona a referida Fundação. Os arménios não esquecem. Neste vídeo, a sua célebre canção «Pour toi, Arménie», interpretada por numerosos artistas:


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A Grécia e as suas originalidades




«It’s only odd that the party SYRIZA is also the ruling party of Greece that signed the 3. bailout agreement and all the additional austerity measures and so-called “structural reforms” and implements them as well.»
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Até que o vós me doa



Ricardo Araújo Pereira na Visão de hoje:

«Tenho saudades de uma pessoa. É a segunda pessoa do plural. Em Lisboa, como sabeis, fora do púlpito praticamente ninguém a usa. Se calhar, tem um sabor antigo – e vós desejais ser modernos. (…) A segunda pessoa do plural foi substituída por uma formulação meio esquisita. Em vez de “vós falais”, dizeis “vocês falam”, [o que] constitui uma mixórdia linguística. (…)

E, de caminho, tentemos também recuperar esta forma de imperativo que parece usar o presente do conjuntivo. Nos livros, ainda se diz: “Brindemos à saúde do Vítor”. Na vida real, no entanto, toda a gente diz: “Vamos brindar à saúde do Martim”, não só porque ninguém usa aquele imperativo, como porque já quase ninguém se chama Vítor.»

Na íntegra AQUI
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Eu é que sou o presidente da Junta

O manto de invisibilidade que cobre o racismo



«Qual é a dimensão do problema da discriminação racial em Portugal? Manifesta-se em todas as áreas e em todos os sectores? Ou é um fenómeno excepcional? Só se manifesta em certas camadas da população? Só em relação a certas comunidades específicas? E de que formas se reveste a discriminação existente? (…)

A resposta oficial é que não sabemos. Não há estatísticas porque, tanto para o Estado como para as organizações privadas, não existem cidadãos com diferentes origens étnicas, diferentes religiões e diferentes cores de pele. (…) A questão é que este não-registo não só não protege os mais frágeis como esconde os crimes da discriminação racial. Há outras formas de responder a estas perguntas. Podemos perguntar aos elementos dos grupos que são objecto de discriminação. Aos imigrantes, aos negros, aos ciganos. Aí, as respostas são radicalmente diferentes do panorama oficial da não-discriminação. As histórias dos imigrantes ou dos cidadãos afro-descendentes portugueses não estão apenas recheadas de episódios de discriminação. São vidas de discriminação.

E há ainda outra maneira de responder a estas perguntas: olhar à nossa volta. A religião não se vê, mas a cor da pele é evidente. Basta olhar para os grupos de crianças que saem das escolas básicas e para os grupos de jovens que entram nas faculdades para verificar como os mais morenos se perdem pelo caminho enquanto se vão concentrando nos sectores mais pobres, nos empregos menos remunerados. (…)

Que a discriminação racial é um problema real e grave em Portugal ninguém tem dúvidas. Mas a questão é escamoteada há décadas no discurso oficial, alimentando o mito do “Portugal não racista”.

Esta semana, o Comité da ONU para a Eliminação da Discriminação Racial deverá tornar público um relatório sobre Portugal, para o qual vários organismos estatais enviaram contributos. Mas 22 organizações de combate ao racismo queixam-se de a sua contribuição não ter sido pedida pelas entidades oficiais, o que significa que o retrato resultante irá provavelmente branquear a situação real.»

6.12.16

Boa questão


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Dica (450)




«Listening to the media, you would think that yesterday’s Italian referendum results were yet another victory of right-wing populism against democracy. The situation, however, is much more complex than this, and the No victory is a victory for democracy and for the defense of social rights worth celebrating.
The constitutional reform proposed by Matteo Renzi’s government was politically illegitimate in its method and antidemocratic in its content.» 
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Itália: se a normalidade democrática é um problema para o euro, o euro é um problema



Daniel Oliveira no Expresso diário de 06.12.2016:


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Novas profissões, novas oportunidades



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Acabou-se a "la dolce vita"



«Matteo Renzi, julgando ser o herdeiro de Lorenzo de Médici, "O Magnífico", julgou que a acção política lhe garantiria alguma eternidade no poder. Equivocou-se. Renzi chegara a primeiro-ministro através de jogos de poder: agora, ao tentar atravessar o Rubicão, afogou-se nele. Não é o fim do mundo para Berlim e Bruxelas: Merkel detestava Renzi e espera agora que uma coligação de direita liderada por um tecnocrata trave Beppe Grillo, um bardo que deseja a saída da UE e do euro. Itália não é Portugal ou a Grécia: é uma gigantesca pizza difícil de digerir. Para já a fatia mais indigesta é o periclitante sector bancário italiano: este tem cerca de 20% da enorme dívida italiana. Os bancos italianos têm financiado o Estado e esperam, com impaciência, que este os financie agora. Era um "trade-off" normal, mas que a UE detesta.

A outra fatia de pizza que assusta Bruxelas e Berlim é a possibilidade de um vazio do poder que possa permitir o assalto dos bárbaros de Beppe Grillo. Este não quer o euro. E sem Itália, e com França a começar a ficar muito periclitante, imagina-se o que poderia suceder então se as periferias se rebelassem contra o império da fé no euro e no Tratado Orçamental. O problema é que este não é um filme de Federico Fellini, mesmo parecendo: como em "La Dolce Vita", Itália tem de escolher entre duas formas de vida. Tal como França. Em comum há o mal-estar das antigas classes médias que viram como a globalização e a imobilidade rancorosa da UE, com a sua célebre "desvalorização interna", acabavam com a sua segurança e com a esperança de futuro. Não admira que a sereia do populismo seja música enternecedora. A decadência da Europa está na mesma: continua sem perceber porque nascem Beppe Grillos.»

Fernando Sobral

5.12.16

Dica (449)




«And yet Brexit and the Renzi resignation do form part of the same story. The European project is under unprecedented strain. Britain’s decision to leave is the most striking evidence of this. But, in the long run, the unfolding crisis in Italy could pose a more severe threat to the survival of the EU. The reasons for this are political, economic and even geographic.» 
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Racistas, nós?




«Pelo menos 22 associações que representam milhares de afro-descendentes negros em Portugal enviaram uma carta ao Comité das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação Racial a criticar o Estado por não reconhecer que são precisas políticas específicas para estas comunidades. Queixam-se ainda de “falta de verdadeiro diálogo” do Estado com as entidades que lideram o combate ao racismo e à exclusão no terreno. A carta de duas páginas, enviada esta segunda-feira, inclui uma análise em números das desigualdades raciais em Portugal que justificam a necessidade de existirem políticas direccionadas para estes grupos.

Assinado por associações como a SOS Racismo, Plataforma Gueto, Afrolis, Djass, Associação Caboverdeana de Lisboa, Griot e Femafro, o documento surge depois de uma delegação portuguesa, integrada por representantes de entidades do Estado, ter sido ouvida na semana passada, em Genebra, pelo Comité das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação Racial. O desempenho de Portugal quanto à discriminação racial está a ser avaliado pelo comité e os resultados serão anunciados a 9 de Dezembro.» 
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Sobra Merkel



Até ver.
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Simbolismos nacionais



«No dia 1 de Dezembro, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa juntaram-se numa despedida sem lágrimas. Elogiando a recuperação do feriado que une os portugueses, o da Independência Nacional, fizeram as exéquias políticas de Pedro Passos Coelho.

É difícil recordar um momento em que um político português tenha sido incinerado assim, sem qualquer misericórdia. Passos Coelho foi removido da política nacional pelo que fez e pelo que ainda julga que pode fazer. As palavras de Marcelo (este feriado nunca deveria ter sido eliminado) e de Costa (houve quem menosprezasse esta data histórica) desnudam a falta de sensibilidade de um político que governou o país como se fosse um jogo de computador e que julga que poderá ressuscitar como salvador da pátria. (…)

Não há memória de uma exéquia política assim, feita a frio, sem contemplações. Depois disto, Passos Coelho pode dizer tudo, mas já ninguém o levará a sério. Ficou na História como alguém que desprezou um símbolo maior de união dos portugueses e algo que, como a bandeira ou o hino, lhes lembra que são independentes. Apesar da dívida. Apesar do défice. Apesar da União Europeia. (…) Passos fica agora só. Já nem terá o trunfo Pedro Santana Lopes. E terá de engolir Paulo Macedo na CGD. Há políticos que chegam assim ao fim. De forma muito triste.»

Fernando Sobral

4.12.16

Dica (448)



The Skills Delusion. (Adair Turner) 
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Há 55 anos, uma espectacular fuga de Caxias



Em 4 de Dezembro de 1961, oito presos políticos personificaram uma fuga do forte de Caxias, não menos espectacular do que a de Peniche ocorrida quase dois anos antes, mas muito menos conhecida provavelmente porque não envolveu a pessoa de Álvaro Cunhal.

Derrubar um portão de um forte com um carro blindado, supostamente oferecido por Hitler a Salazar, e fazê-lo depois de uma longa preparação que implicou que o seu principal intérprete tenha fingido «rachar» (ou seja passar para o lado da polícia), para se movimentar à vontade e preparar todos os detalhes, nada tem de trivial e é digno de homenagem e admiração. Pertencerá para sempre ao nosso património – material ou imaterial, como se preferir, mas bem real e a ser preservado.

1961, Anno Horribilis para Salazar. Faltava a cereja em cima do bolo: daí a uns dias, cairia Goa...

Descrição detalhada:


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Para recepções a altezas reais


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França: Quem é o dono da poção mágica?



«O antigo Presidente Charles de Gaulle sintetizava numa frase o problema central de França: "Como se há-de governar um país que tem 246 variedades de queijo?" A pergunta não era retórica. De Gaulle era um homem partidário de soluções fortes, como mostrou ao longo da sua carreira política. Mas, defronte das respostas de França às suas iniciativas, percebeu a fragilidade do seu poder. Há muito que os franceses procuram uma poção mágica (como a que ajudou Astérix e os seus bravos gauleses a combater com sucesso o poderio romano) capaz de dar resposta às suas inquietações.

Por um lado, a sua situação económica (e do emprego) é preocupante. Por outro, muita da "profunda França" vê com desconfiança o multiculturalismo e, sobretudo, quer uma resposta musculada ao terrorismo islâmico. Como se isso não bastasse, os franceses assistem, há muito, a uma subordinação do seu país às opções da Alemanha dentro de uma União Europeia que tinha sido desenhada à medida de dois poderes fortes que dividiam entre si as decisões. (…)

A vitória de François Fillon nas directas dos republicanos diz muito sobre esta nova França. Ele, que partia como o mais frágil dos candidatos (Sarkozy dizia que ele era o "Mr. Nobody"), impôs-se a Nicolas Sarkozy (o mais estridente defensor de políticas mais à direita) e a Alain Juppé (mais centrista). Não foi um acaso do destino: Fillon, que foi primeiro-ministro durante a presidência de Sarkozy, vem há muito lamentando o declínio económico francês. Mas, escudado na ventania "anti-establishment" que levou Donald Trump à Casa Branca, Fillon acabou por ser a melhor voz de uma França inquieta. Por um lado, é uma França conservadora e católica que não tem visto com bons olhos leis liberais em áreas como a da família. Por outro lado, detesta a elite de Paris, que considera culpada por tudo. Fillon percebeu o que esses franceses desejam: defesa dos valores tradicionais, conter a imigração e voltar a impor o poder francês fora das fronteiras. (…)

As suas francas hipóteses de vencer, quer François Hollande (ou outro candidato da esquerda) quer Marine Le Pen, são visíveis: o seu discurso é duro e de ruptura. Algo que muitos querem ouvir. /…)

A entrada em cena de François Fillon vem mostrar como França se está a virar para a direita e para a defesa de políticas mais duras contra os fantasmas que a assolam. Mais uma dor de cabeça para Bruxelas e para Angela Merkel, que vão vendo esboroar-se a ideia de uma União Europeia feita à medida das ideias de Berlim. Isto mostra também uma deslocação de França do centro de gravidade da Europa comum, por troca com um país mais isolado e com soluções próprias para os seus problemas. Se Marine Le Pen é a solução mais rápida e dolorosa para o estilhaçar da União Europeia, Fillon representa uma opção não menos dura. Mais diplomática. Mas, ao mesmo tempo, é um sinal destes tempos anti-elites e antiglobalização. E é para aí que caminha França. Em busca de uma poção mágica que lhe traga a força perdida.»

Fernando Sobral